Marta Fernandes de Sousa Costa*
Na primeira manhã em Veneza, impossibilitados de entrar na Praça São Marcos pela água que já atingiu as passarelas, saímos a caminhar pelas ruas, sem destino. São tantos palácios e belas edificações, tantas pontes que conduzem a destinos interessantes, tantas vitrines atraentes, que qualquer escolha se mostra boa.
A cidade é silenciosa, sem o barulho de automóveis. As pessoas conversam em voz baixa, ouve-se o ruído dos passos no calçamento; a voz de algum gondoleiro, a entoar canções italianas para os turistas, quebra a quietude, vez por outra.
No passeio de gôndola, percorremos parte do Canal Grande, o que é interessante, pois o Canal é circundado por palácios e igrejas imponentes e todos possuem a frente voltada para ele. Depois, a gôndola percorre os canais internos, que são estreitos, obrigando a algumas manobras e recuos, quando outra vem na direção contrária. A água chega ao pórtico das casas, que possuem bombas para drená-la, quando a maré sobe. Algumas casas recebem reparos; todas parecem perder a luta contra a umidade. Imagino o custo de qualquer obra, nessas circunstâncias, e o perfil psicológico das pessoas que vivem aqui, adaptadas à situação.
Quando retornamos à Praça São Marcos, a água já baixou completamente, as passarelas foram retiradas e, se não a houvéssemos visto inundada, pela manhã, teríamos dificuldade em imaginar o quadro.
À primeira vista, desperta a atenção o Campanário de São Marcos, com quase 100 metros de altura, construído para vigia, no século IX, e onde Galileo Galilei fazia descobertas, com seu telescópio. Em frente ao Campanário, paramos para olhar a Torre do Relógio, onde os dois gigantes em bronze tocam as horas com suas marretas. A seguir, entramos na Basílica de São Marcos. Símbolo do poder religioso e político, reservada apenas aos duques e aos pertencentes aos altos escalões, somente no século passado a Basílica foi aberta ao povo e transformada na Catedral de Veneza.
Localizado ao lado da Basílica, o Palácio Ducal merece atenção especial, pela história que conta, em seus inúmeros e grandiosos salões. O poder dos duques, embora grande, não era hereditário, nem absoluto. Sendo eleitos pela elite, dependiam da aprovação dos seus pares, por isso lhes dedicavam tratamento atencioso, percebido pelas imensas e belas salas de reunião.
Ao entardecer, a música toma conta da praça. Atraídos por ela, entramos no Café Florian, onde encontramos o piano e o violino responsáveis pelo encantamento.
À noite, vamos à Iglesia de San Vidal, para a apresentação de uma orquestra local, Interpreti Veneziani, tocando “As quatro estações de Vivaldi”. A orquestra, composta somente por músicos venezianos, fará várias apresentações durante o mês de dezembro, participando da temporada “Violinos em Veneza”. Somos os primeiros a chegar, mas a igreja enche completamente. Os músicos valem cada minuto dedicado a eles. Atrás deles, sobre o altar, é fascinante a figura feminina esculpida em mármore, o rosto coberto por véu tão leve que jamais se imaginaria esse efeito pudesse ser obtido com a pedra. Para onde se olhe, em Veneza, encontra-se arte.
*www.martasousacosta.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário