domingo, 20 de fevereiro de 2011

Egípcios começaram um tsunami revolucionário. Muro de "Berlim" dos ditadores começa a desmoronar-se


Willian Tonet*

Os jovens do país das Pirâmides e dos Faraós, deram uma prova inequívoca ao mundo que a força de um povo, sedento de liberdade, não tem barreiras intransponíveis. Sem armas, sem bastões, apenas munidos com a força dos pulmões e da grande crença e amor pelo país, reuniram o que sobrava das suas parcas energias, para afrontar a toda-poderosa máquina bélica da guarda presidencial de Hosni Moubarak.

No início poucos acreditaram, que uma marcha, iniciada por jovens, num lugar emblemático, seria capaz, apenas com a força dos gritos e da crença de derrubar e colocar em silêncio o 10º maior exército do mundo. Mas foi...

Numa clara demonstração de serem, por vezes, falíveis teorias político-filosóficas, como as de "a história do mundo ser a biografia dos grandes homens", segundo Thomas Carlyle.

Mas se Hosni Moubarak, foi um grande homem, deixou-se arrastar, ao longo dos anos de poder, na lama da ambição, da corrupção e dos assassinatos selectivos de todos quantos pugnassem por um estilo de governação diferente.

Infelizmente, no mundo actual, muitos países detentores de riquezas naturais, quando governados por déspotas, os seus povos vêm a sua liberdade e cidadania espezinhadas. Isso por os ditadores atribuírem-se "dons supremos", como se fossem divinas figuras pré destinadas ao arbítrio governativo. E para consumação do seu reinado escudam-se numa aparatosa força militar intimidatória, impondo medo aos respectivos povos.

Moubarak, tinha algum prestígio internacional, mas internamente, apenas satisfazia a sua família e corte de bajuladores, enriquecida a custa da rapina do erário público. A riqueza nacional, estava nas mãos de uma só força política e do batalhão de bajuladores do chefe, tanto que nada que respira como empreendimento económico, está fora desta casta.

Assim, os milhões de egípcios, principalmente, jovens viviam no limiar da discriminação institucional, do desemprego, da pobreza extrema e sem uma esperança num futuro melhor, tantas vezes prometida por Moubarak, para se arrastar no poder. Neste contexto, não tinham outra saída, que não sair à rua e exigir a queda do regime, contra todas as expectativas do mundo ocidental, que os árabes e os egípcios em particular, face ao poderio do regime, fossem capazes de protagonizar a nova gesta revolucionária do século XXI, contra a tirania, quais dinossauros sobreviventes, e derrubar grilhetas e muros. Os jovens do Egipto não estavam ligados a nenhum movimento religioso, pois grande das igrejas e seitas vassalavam ou mesmo temiam Moubarak, como era o caso da Irmandade Muçulmana, que só no fim se juntou a REVOLUÇÃO VERDE da juventude, cujo bastião estava na praça Tahrir Square.

É claro que nada previa fosse este movimento vingar, mesmo Moubarak acreditou que iria vencer o povo pelo frio e cansaço, mas a realidade mostrou outra forma de resistência e de luta, que surpreendeu o mundo ocidental e africano, tal como o ocorrido na queda do MURO DE BERLIM, na Alemanha comunista, derrubado pelas mãos sofridas de um povo oprimido.

Assim que melhor exemplo ainda querem os outros ditadores africanos, para não mudarem de estratégia? Será que Robert Mugabe, Teodoro Obiang, Sassou Nguesso, todos à mais de 31 anos no poder, todos amigos do presidente angolano, não acreditam estar na hora de produzirem verdadeiras reformas, dar oportunidades a outros cidadãos, distribuírem melhor as riquezas nacionais nos seus países? Não se dão conta que prender arbitrariamente ou ordenar assassinatos selectivos não são solução para a sua longevidade no poder?

Os egípcios demonstraram que quando um povo clama, mesmo que dure muito, nada impede que corram as águas do rio. Que digam como correram e arrastaram as águas do Rio Nilo, o ditador Hosni Moubarak, ele também um faraó de mais de 30 anos de poder.

Por esta razão é confrangedor verificar a falta de discernimento destes longevos líderes, ante a este movimento contagiante que não vai ficar nas margens do Egipto, mas invadir todas as lavras onde a fome e a discriminação empreendida pelas ditaduras corruptas, assassinas e violadoras das leis imperam.

No Egipto, por exemplo, a família Moubarak eram donos de mais de metade dos empreendimentos económicos do país, com uma fortuna milionária acumulada com o sangue de muitos egípcios e a rapina do dinheiro público.

Os seus apaniguados, passaram, eles também, a ficar indiferentes ante a pobreza, o sofrimento, o desemprego, a falta e fraca educação e saúde públicas, tornando o povo mero sobrevivente de uma ganância desmedida. Assim a instituição mais importante no Egipto passou a ser a corrupção e o favoritismo de uns contra a maioria da população que vivia no limiar da pobreza extrema. Por isso este movimento de protesto foi tão intenso e decidido, ao ponto de mobilizar e imobilizar o exército a favor da causa popular. Os militares não traíram o povo, não viraram os seus canhões e balas contra os corpos dos seus irmãos, primos, pais, irmãs e mães que clamavam por uma nova aurora. O exército foi fiel a sua função de garante da soberania e ela, no momento era o povo, logo, ainda que protegendo a segurança física do ditador, não mais acolheu as suas ordens de esmagar ou matar a revolta.

Os jovens do Egipto mostraram que mesmo não havendo liberdade de imprensa, de expressão, de manifestação e os órgãos de comunicação social públicos e privados, as telecomunicações, estarem nas mãos dos ditadores a informação popular pode moldar a mente dos milhões de sofredores e virar os regimes ao avesso.

Os jovens egípcios demonstraram, também, que ninguém, nem mesmo um regime político por mais forte que julga ser (Moubarak, recebia mais de 1 bilião de dólares isentos de juros, anualmente, do governo americano, para as suas Forças Armadas), consegue submeter eternamente um povo a submissão, a escravatura, a discriminação e a pobreza. O povo estava decepcionado e gritava: "Fora Moubarak; Fora Ditador; Liberdade, Democracia já". E acreditar, que não há muito tempo o cinismo do Ocidente havia reconhecido as últimas eleições em que o ex-presidente, chegou a condenar o seu potencial adversário à cinco anos de prisão. Mais o partido de Moubarak, a exemplo do dos outros ditadores, fazem parte da Internacional Socialista. Uma estranha forma de acreditar a dualidade de critérios desta organização que se julgou farol das liberdades, quando hoje acoita no seu seio, gente da pior estirpe, pese os seus estatutos continuarem a pugnar pela defesa dos Direitos Humanos, Liberdade de Expressão, de Imprensa e Democracia. Quais é a resposta que os egípcios esperaram durante muitos anos, tal como o resto dos povos do mundo árabe e africano e apenas receberam o cinismo e omissão da comunidade internacional, ante a tortura que vegeta nas ditaduras. Outra demonstração evidente nesta revolução é de ser pior, em fases de mudança, os ditadores confrontarem-se com a ausência de um interlocutor válido, por terem acreditado que partidarizando as instituições do Estado e fragilizando os partidos políticos, comprando os seus líderes ou criando partidos fantoches, conseguirão reinar "ad eternum". Claro engano. Pois é difícil ou quase impossível, negociar com um poder que está na rua, pela sua imprevisibilidade, radicalismo e intolerância, face a provação e discriminação a que estiveram votados ao longo dos anos.

Ademais não acredito que os jovens e populações do Egipto, do Iémen, da Jordânia, da Argélia, da Tunísia, do Irão, do Iraque, da Líbia, da Arábia Saudita, entre outros, possam aceitar a saída de um ditador ou ditadores, por outros, como os da Irmandade Muçulmana, que pretendem institucionalizar a Sharia, através dos seus líderes fanáticos, que subvertem o Corão.

O que o povo quer é liberdade de imprensa, liberdade de expressão, direitos humanos, melhor governação do erário público, melhor distribuição da riqueza nacional, mais justiça, eleições livres e justas, fim das fraudes e melhor oportunidade para todos. Um desejo, afinal, que a democracia comporta, com a mais pura naturalidade, no seu seio.

A revolução no Egipto é de cidadania, cujo rastilho, já deflagrou na sua região, mas é e será capaz de germinar em todos os campos e só os fanáticos não vêm a necessidade de rápidas transformações, nos seus países, se é que ainda vão a tempo, evitando sair como ratos de um poder corrupto e militarmente preservado.

*No Cairo

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