quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Dr. Malaquito doente na cadeia. Regime insensível nega habeas corpus ao líder do Protectorado da Lunda


O que se está a passar com os activistas das Lundas é, para não sair do registo habitual, vergonhoso. Aqui apresentamos a última notícia que põe um termo à esperança de ser aceite o pedido de Habeas Corpus solicitado em favor dos detidos pelo advogado David Mendes, no 14 de Janeiro de 2011.

O regime nega a concessão do Habeas Corpus, um instituto constitucionalmente consagrado, no art.º 68.º da CRA, aos presos políticos de delito de opinião do Protectorado das Lundas, pese o seu líder, o jurista Jota Filipe Malaquito estar gravemente doente e a vegetar nas fedorentas masmorras da Cadeia Central de Viana, misturado com presos de delito comum.

Esta forma humilhante de tratamento dos adversários políticos, não parece ter a sua essência na colonização portuguesa, mas na ditadura comunista. Isso porque, no período de Salazar, os nacionalistas angolanos, quando presos pela PIDE, face as suas opções de independência, não eram lançados em celas com delinquentes comuns.

Infelizmente, para os autóctones, em pleno século XXI a compreensão governamental não separa o trigo do joio, tão pouco o estatuto e o grau académico dos adversários políticos.

Daí que assistamos actos, muitas vezes, tresloucados das instituições, quando em causa, decidem apagar a reivindicação dos adversários políticos com a arma mais a mão de semear: a cadeia, como o caso da prisão do presidente da Comissão do Manifesto do Protectorado da Lunda, Jota Filipe Malakito.

A insensibilidade e a falta de provas contra os membros do Manifesto, presos é uma clara e flagrante violação aos direitos humanos e poderá se não houver evolução resultar na morte de mais um cidadão que acreditando na existência de um Estado democrático, apenas reivindicou um direito. A autonomia pretendida da sua região rica em minerais mas pobre do ponto de vista económico, social, educacional e infraestrutural não pode constituir um crime, num Estado Democrático e de Direito, salvo se estivermos diante de uma ditadura.

Se assim é, então, começam a justificar-se as muitas bolsas de descontentamento que este regime, cego pelos milhões de dólares que as contas de alguns dos seus principais dirigentes ostenta e os cega ante o barril de pólvora em que nos deitamos.

O país não está bom: no Norte, no Sul, no Leste, no Oeste. É preciso que o regime, ante o avançar do descontentamento incubado da maioria dos autóctones, que sobrevivem com menos de 1 dólar/dia, mude ou ajuste, rapidamente as suas políticas de gestão, fazendo ainda uma melhor distribuição da riqueza nacional, actualmente, concentrada nas mãos de alguns dos principais dirigentes, suas mulheres e filhos que ante a pobreza generalizada, não se coíbem de ostentar publicamente sinais exteriores e interiores de riqueza não justificada.

A forma como está a ser tratado juridicamente o processo de Jota Filipe Malakito, internado nos últimos dias, hospital - prisão de Viana, face a degradação do seu estado de saúde, não demonstra isenção e imparcialidade da aplicação da lei, mas a existência de factores políticos interferentes, responsáveis pela sua prisão infundada desde Maio de 2009.

“Ele tem sérios problemas nos joelhos, que estão inflamados e só se desloca mediante uma liga elástica, bem como uma preocupante inflamação nos testículos, causas que lhe fazem perder diariamente a visão”, disse o secretário-geral da sua organização José Mateus Zecamutchima.

Recorde-se que neste desconexo processo, estão “ilegalmente” presos 39 (trinta e nove) activistas na Lunda norte ao abrigo de uma Lei de Segurança do Estado, já revogado e da qual, muito recentemente, o Tribunal Constitucional considerou de inválida, posição que viria a beneficiar os activistas dos direitos humanos de Cabinda. Com base neste pressuposto e como forma de haver justeza para com todos os cidadãos encarcerados por esta famigerada lei é que o advogado de defesa, solicitou um posicionamento jurídico imparcial do Tribunal Supremo.

“A Lei nº7/78 foi revogada pela Lei nº23/10 de 3 de Dezembro, dando origem ao Acórdão nº 123/2010, do Tribunal Constitucional, que manda aplicar o “n.º 4 do artigo 65.º da Constituição da República de Angola que estabelece a aplicação retroactiva das leis penais de conteúdo mais favorável aos arguidos”, sustenta a equipa de advogados, para quem esta visão é, coincidentemente, acolhida pelo nº 1 do artigo 6.º do Código Penal.

Ademais não se pode descartar, no caso dos presos de delito de opinião da Lunda, tão pouco passar ao largo do acórdão do Constitucional, que a dado passo elucida: “com a nova lei dos crimes contra a Segurança do Estado (Lei nº 23/10 de 3 de Dezembro) deixou de existir no ordenamento jurídico a norma do artigo 26º da Lei nº 7/78 de 26 de Maio ou norma de teor equivalente a esta dos “OUTROS ACTOS”. Tal significa objectiva e claramente que, o legislador pretendeu expurgar da ordem jurídica esse tipo de crime assim descriminalizando tal conduta em obediência ao Princípio da Legalidade penal”. E ainda que o caso tivesse transitado em julgado, diz o TC, “a descriminalização, representa excepcionalmente, um dos únicos momentos no ordenamento jurídico em que o princípio constitucional do caso julgado é destruído.”

Ora se pelos mesmos factos foram julgados e condenados em Cabinda, quatro cidadãos pelos mesmos fundamentos e a eles aplicada a mesma norma incriminadoras a que os membros da Comissão do Protectorado da Lunda estão sujeitos, por igualdade de razão estes cidadãos a exemplo dos de Cabinda, devem também ser restituídos a liberdade.

Não tendo sido este o entendimento do Tribunal de Luanda e da Lunda, os advogados decidiram apelar ao Tribunal Supremo o Habeas Corpus, que infelizmente deve estar a espera de ORDENS SUPERIORES.

Oxalá que até lá não morra mais nenhum destes homens cujo crime foi o de reivindicarem a vitalidade de um documento existente entre as autoridades coloniais portugueses e os autóctones do Reino Tchokwe, no século passado. Se estes governantes conseguem comemorar a data das cidades fundadas por colonialistas portugueses, que quando aqui aportaram já cá encontraram povos Bantus, recorde-se a recente comemoração dos mais de 400 anos da cidade de Luanda (Angola independente só tem 35 anos) não se percebe a resistência em reconhecer e discutir estes textos, com os adversários, numa clara demonstração de ser mais fácil devolver tudo aos portugueses, mesmo parte da soberania do que aos autóctones.

Só desta forma se justificam as palavras arrogantes do procurador provincial da Lunda-Norte, Celestino Paulo Benguela, durante uma das sessões de julgamento de três membros do Manifesto do Protectorado das Lunda, no dia 07 de Setembro de 2010: “o chamado Protectorado da Lunda, tem a sua sede em Luanda desde 2007, encabeçado pelo «Bandido do Dr. Jota Filipe Malakito», ele tem um exército com as suas regiões constituídas e os seus respectivos comandantes. O Dr. Jota Filipe Malakito diz que tem na sua posse documentos do protectorado da Lunda Tchokwe, mas ele ameaçou dizendo: “Se o governo agir com violência, também responderemos com violência”, razão pela qual querem dividir Angola, excluindo as 4 províncias do resto de Angola. Angola é um país uno, indivisível, e quem pretender o fazer, será punido por lei 7/78 de 26 de Maio... Pois fiquem a saber que todos os vossos membros e outros Lundas que quiserem, aderir neste vosso movimento serão detidos e condenados, nós até podemos matar, não há nenhuma porcaria de Tchokwe ou Lunda que vai levantar a voz, seus separatistas e tribalistas, devem ser combatidos energicamente e o vosso crime é prisão maior entre 8 a 16 anos ou mesmo 24 de cadeia”.

Este é o tipo de discurso de um magistrado, que mais se assemelha a de um mobilizador partidário do comité de especialidade. Esta é a chamada reconciliação nacional, né?

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