quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Angola em 8 anos. Avanços económicos no papel distantes da realidade social diária


Segundo o FMI, em 2002, com o fim da guerra civil, o país arrancou para um novo ciclo marcado por um forte crescimento económico, sustentado principalmente pelo aumento das receitas associadas ao petróleo, reconstrução de infra-estruturas produtiva e realojamento de cerca de 4 milhões de deslocados internos. Em 2007, o mesmo FMI revelou que Angola era o país que tinha o maior crescimento económico do planeta, devendo expandir-se em cerca de 35% só nesse ano.

Porém, ao avançar assim, numa perspectiva de céus azuis, o FMI não tinha nada que dar explicações sobre o verdadeiro significado dessa ocorrência, ou seja, que mesmo que se verifique a um determinado momento um espectacular crescimento da economia de um dado país e mesmo que em certos sectores ele ultrapasse os 100, 200, 300, ou mais por cento, tal performance não significa que se verifiquem progressos no que toca à qualidade de vida das populações desse país em geral, na esperança de vida, no nível de pobreza de escolaridade e de saúde pública, etc.. Não tinha nada que dar e não deu, o que teve como consequência imediata o aparecimento espalhafatoso dos clarins do regime autocrático angolano, a louvar o chefe, a boa ventura do povo de o ter por chefe e os milagrosos crescimentos a que nos referimos supra.

Evidentemente que também não houve ninguém que fosse nessa altura explicar aos angolanos que a economia nacional repousava sobre alicerces pouco fiáveis por serem caracterizados por uma grande e desproporcionada assimetria presente na própria estrutura da economia angolana, na qual assumem especial relevância os recursos naturais – Petróleo e Gás (49%) e Diamantes (5%) representando pois 54% do PIB – e, na óptica da despesa, as exportações a pesarem em 80% do PIB.

Faraó dos pobretanas dá nas vistas
Avançaram então os nossos dirigentes para a realização de projectos perfeitamente megalómanos para um país como o nosso, foram remodeladas as estradas do colono e construíram-se as muito necessárias novas estradas, milhares de quilómetros, construíram-se escola, hospitais, abriram-se novas universidades, prometeram-se mil coisas aos angolanos, que dizemos nós, mil não, um milhão de casas, para começar, centenas de milhares de postos de trabalho e como que para coroar tanto aparato calhou-nos na rifa ter de realizar a Copa de África das Nações de 2010 e só para isso foram-se buscar aos cofres do Estado mais de 2,5 mil milhões de dólares.

Construíram-se mais estradas, mais parques de estacionamento, e quatro maravilhosos estádios a fim de condignamente receber todos os participantes ao CAN 2010 e levar a bom termo esse esplendoroso evento.

Mas, como era de esperar no meio de tanta euforia, também não apareceu ninguém para explicar aos angolanos que tudo isso não passava de “banga”, tudo fachadas para mostrar ao mundo uma perícia também ela de fachada.

Entretanto, ainda no tempo dos preparativos para o CAN 2010, deu-se a crise económica e financeira mundial de 2008, que em nada deveria afectar o prodigioso potencial da economia angolana, como pregaram os mais ouvidos arautos do Governo. E este acreditou. Resultado: o dinheiro continuou a ser gasto, esbanjado sem contar, para benefício quase exclusivo da propaganda a um regime apenas preocupado com o que se poderia pensar dele no estrangeiro e, subsequentemente, a anos luz dos principais problemas do povo, num monstruoso “bras d’honneur” a “Manguxe”.

Tudo começou a andar para trás no ano de 2009. O petróleo deu uma cambalhota das grandes e chegou a estar cotado a pouco mais de 30 dólares o barril depois de coisa de um ano e meio antes ter atingido cotas de muito mais de cem dólares.

As despesas eram tantas nessa altura que essa queda do preço do nosso ”ouro negro” acarretou consequências desastrosas para a nossa economia, a ponto de nem sequer haver dinheiro para pagar os funcionários públicos, quanto mais os predadores estrangeiros que tinham vindo para enriquecer e estavam à espera que lhes pagassem as dívidas contraídas na feitura de todas essas faraónicas empreitadas.

Chineses, Portugueses, Brasileiros, Franceses e mesmo o FMI apareceram a dar o sagrado dinheirinho que tanto estava a faltar. Uns perdoaram, outros emprestaram, enfim houve os que aproveitaram a deixa para fazer mais um bom negócio pela ocasião.

O governo, por seu lado tentou meter água na fervura e chegou mesmo a dizer que tudo ia muito bem, fora o que ia mal, mas que tudo estava sob controlo. Como prova disso juraram que 385 mil novos postos de trabalho tinham sido criados. Quando essas informações foram apresentadas ao público, os empresários disseram que isso não «era possível. Porque nomeadamente no domínio da construção, junto com a agricultura, que são os sectores que mais empregam, houve dispensas. Ninguém podia acreditar. Toda a gente fez de conta que acreditou

Mas a verdade é mais dramática. O que se passa é que realmente ninguém sabe o que se estás a passar em Angola. Não existe sistema estatístico confiável, ninguém sabe o que aconteceu em 2009 e em 2008, nem em 2007. Só para dar conta, a Universidade Católica de Angola estima que o crescimento económico em 2009 tinha sido inferior a 2%, 1,9%. O governo indicava 2,74%. O Fundo Monetário Internacional apresentou uma cifra negativa de 0,4%. A revista The Economist anunciou uma taxa estimada para o crescimento do PIB de menos 2%. O Banco Africano de Desenvolvimento estima em 0,1%. Portanto, não se sabe nada. O que convém ao nosso Estado, mistificado e congénito.

O que se vê, então, ainda é mais dramático, a taxa de pobreza, embora ninguém saiba exactamente qual é, não é preciso ser bruxo para certificar que é extremamente elevada. Um dos últimos dados que temos é de 2002, que dava conta de uma taxa de pobreza ao redor de 70%, já incluída a população que vive abaixo do nível de pobreza ou a população que vive com menos de 2 dólares por dia. A pobreza extrema que abrange a população que vive com menos de US$ 1,25 por dia, andava a volta dos 30%.

AUMENTO DO FOSSO SOCIAL
O fosso social continua a crescer. Nunca, jamais em tempo algum o Estado disse: “Bem agora vamos tirar dos ricos e dar aos pobres”. Pelo contrário. O Estado cegamente apoiado pelo MPLA privilegia, apoia a constituição do que o partido chama estabilidade por cima, resultante da distribuição de bens, benesses e postos de comando sem nada a comandar.

Numa entrevista publicada a 11 Jun 2010 na Folha de S. Paulo, o Dr Alves da Rocha deu uma boa explicação: «Há muitos políticos, governantes, dirigentes ligados ao partido que alugam suas casas, vão viver em condomínios que são do estado, e recebem uma renda de US$ 25 mil ou US$ 30 mil mensais do sector petrolífero. As petrolíferas pagam essa renda, mas sabe-se qual é o mecanismo. No cost oil, as petrolíferas vão dizer quanto gastaram. E portanto quem esta pagando essa renda? Somos nós, é o governo, é o Estado, é o orçamento. Não há um único ministro que não tenha empreendimentos, não há nenhum ministro neste país que não tenha uma fábrica, ou participe de uma, ou uma fazenda agrícola, meios de transporte, não há absolutamente nenhum. Essa gente é rica, e rica mesmo. São fortunas. Não sei como a revista Fortune não incluiu ainda nenhum angolano, porque há aqui fortunas de US$ 400 milhões, US$ 500 milhões, entre dinheiro, património, essas coisas todas. Isso foi sempre através do Estado».

O extraordinário é que após esta entrevista onde se diz nada mais que a verdade. o Dr Alves da Rocha foi demitido provando apenas que a verdade atingiu alguns dos corruptos que habitam os corredores do governo angolano, que apenas ocupam cargos com o objectivo de sugarem o dinheiro ao povo, mantendo Angola na pobreza e enchendo as suas contas nos bancos europeus com milhões de dólares.

Sim, há um assalto ao orçamento.
Alterar a situação actual significará mexer com interesses, interesses estabelecidos e consolidados. Essa gente vê como uma piada a lei da probidade pública, da tolerância zero. Todos estão de acordo, mas quando começar a tocar nesses interesses as coisas ficam muito complicadas. Porque se alguém alguma vez for denunciado e for levado a julgamento, por não conseguir justificar como adquiriu a fortuna, esse indivíduo, se quiser falar, levará toda a gente a julgamento e à prisão. Porque o MPLA criou uma teia, laços entre os dirigentes em que ninguém fala do outro. Porque se alguém um dia falar, vão-se todos. Porque as relações são umbilicais.

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