Makuta Nkondo tornou-se naturalmente uma figura de referência nacional e internacional inegável e incontornável no xadrez político angolano, respeitado pelos seus adversários, muito por culpa da irreverência dos verbos e adjectivos que emprega e contundência na hora do debate e das opiniões que emite quando é para defender um princípio nacionalista ou esclarecer situações dúbias. Depois de muito tempo interventivo através da mídia e na pele de assessor de imprensa de Isaías Samakuva, tomou posse no pretérito dia 24 de Maio, desta feita como deputado, mesmo assim, nega-se a calar. Foi com o mesmo estilo que nos recebeu e teceu o presente e o futuro seu e de Angola, começando por retratar o calvário à que passou.
Félix Miranda (Texto)
&
Téo Kassule (Fotos)
Folha 8 – Depois de escutar parte de seu passado, ocorre-me perguntar: essa intolerância do MPLA e o facto de considerar concidadãos como estrangeiros, da qual foi igualmente vítima, acha que prevalece?
Makuta Nkondo – Continua e bem. Em Angola não há reconciliação nacional. Sempre disse, o MPLA é tipo camaleão, atira areia aos olhos do público e da comunidade internacional, finge adaptar-se ao momento. Quando do derrube do Muro de Berlim e de todas as ditaduras comunistas, inclusive a União Soviética, o MPLA fingiu adaptar-se. O MPLA aproveita-se sempre da fraqueza da oposição e da população, porque em Angola o maior problema é que a oposição é fraquíssima. A população sempre cai na cantiga de em nome da paz, em nome da estabilidade nacional, não poder reagir, não poder manifestar. O MPLA vai na lógica contrária, é violento quando em causa estão seus objectivos. O MPLA é implacável cumpre tudo quanto ele planeia. Em 2008, o MPLA disse que as eleições seriam em dois dias 5 e 6. Houve um pouco de barulho da oposição, o MPLA disse está bem, mantemos dia 5. Mas as eleições tiveram lugar em dois dias. Por isso, aqui não há reconciliação nacional em Angola, não se enganem. O MPLA não considera a oposição, nomeadamente a UNITA ou FNLA como adversários, mas como inimigos. Para o MPLA não há adversários políticos, há inimigos. O inimigo abate-se, não se prende e o MPLA abate. O MPLA matou impiedosamente o Adão da Silva que era o Comandante da Polícia Nacional, oriundo do Catete, por ter cometido o pecado de um de Catete que fazia parte do governo, aderir a UNITA que é considerada o Partido dos Bailundos, o Partido do Sul. Se o Simão Cassete estivesse aqui seria abatido também por causa da coligação que fez com a UNITA. O MPLA abateu Nfulupinga Lando Victor, abateu o deputado Ngala Ngombe. O único pecado que Ngala Ngombe cometeu_ diz-se na Constituição que o deputado não é responsável pelas intervenções que faz durante as sessões, numa das sessões Ngala Ngombe disse que em África, cabelo branco significa sabedoria, ao contrário, o que estava a notar na Assembleia, o cabelo branco daqueles mais velhos, significava que eles eram castrados mentais; foi abatido. Muito estranho, a Assembleia Nacional, nunca se referiu a Ngala Ngombe que era deputado pela UNITA. Não houve cerimónia fúnebre, nem simples referência, comunicado, nada. O MPLA abateu os negociadores de Bicesse. É por isso que sempre disse, a guerra do MPLA não foi provocada pela UNITA. A UNITA recusou e denunciou a fraude eleitoral e isso é legítimo. Eu Makuta Nkondo concordo que houve fraude eleitoral em 1992. Foi suficiente para o MPLA provocar aquela guerra pós eleitoral, inventando factos como acontece agora, a exemplo do que queriam com David Mendes.
F8 – Curiosamente, fiz parte da Comissão que tentou investigar a Fraude com a Representante da ONU, Margareth Anstee, Salupeto Pena, o actual Vice-presidente da República Fernando da Piedade, se não me engano o General Higino, os juízes Caetano de Sousa e Onofre dos Santos, o Chivukuvuko, Junjunvile, mas depois, o que aconteceu?
MK – Para dizer que, se a UNITA tivesse provocado a guerra, não mandaria o Engenheiro Chitunda como vice-presidente da UNITA, que se encontrava lá no Huambo com Savimbi para ser morto aqui. No mesmo dia que começou a guerra em Luanda, o Salupeto Pena e sua delegação, que eram os negociadores se encontravam reunidos na CCPM. Como é que, alguém que tem intenção de fazer a guerra se encontrava a vontade numa reunião? Depois a noite, o MPLA apresentou aquilo na Televisão, dizendo uma viatura da UNITA foi atacada junto o Comité a Sede do MPLA, ali próximo do Largo 1º de Maio, fazendo crer que era uma tentativa de Golpe. Por isso, para o MPLA, a UNITA e FNLA não são adversários, são inimigos até hoje. É esta a grande dificuldade que eu tenho. Na verdade, nunca fiz parte da UNITA, mas tive sempre simpatia com a UNITA porque nós bakongos, somos fundamentalistas em termos de tradição e vi na UNITA o lado humano. Há muita promiscuidade aqui em termos de identidade nacional. Todos podemos ser angolanos, mas há este condão de angolanidade que vi na UNITA. Pois, a população alógena, a estrangeira imigrante é que assaltou o poder em Angola com o MPLA. Então, fiz-me amigo porque considerei a UNITA como um partido Bantu.
Como deputado, sou independente. Samakuva durante muito tempo insistia para ser assessor dele, de imprensa. Nas vésperas das eleições, renova o convite e eu aceito. Convidou-me também para fazer parte da lista de deputados da UNITA como independente e aceitei. Somos muitos, mas devo defender a linha da UNITA porque não há uma bancada dos deputados independentes.
F8 – Numa única palavra, vai defender o que é, ao justo?
MK – Ali, se a UNITA defender uma posição que não concordo, votarei contra. Também vou dar minhas iniciativas segundo o que acho correcto. Por exemplo hoje estou a defender a tese de uma Administração Eleitoral Independente. Significa para mim, Concelho Nacional Independente. Porque na Côte d’Ivoire, se não fosse a Comissão Eleitoral Independente, a vitória de Ouattará não seria conhecida e vimos também o Conselho Constitucional que é o equivalente ao Tribunal Constitucional, cujo Presidente era parente e amigo indicado por GbaGbo, o que fez é como aqui em Angola. Portanto, não confio este Tribunal Constitucional, também tem que haver uma imprensa independente. Sabe, quando tomei posse, o Presidente da Bancada do MPLA perguntou quem está a favor que Makuta entra na Assembleia Nacional como Deputado. Quase todos os deputados do MPLA votaram a favor, houve quatro abstenções, uma deles veio do jornalista da TPA, e não vou esconder, é o Luís Domingos. Porque um Domingo antes, no nosso programa da Rádio, eu denunciei o papel que jogou a TPA, aquelas cores vermelha e preto, é propaganda, é Fraude Eleitoral. Aquele programa “Angola em Movimento”, passa todo o tempo a projectar que Eduardo dos Santos inaugurou uma ponte, inaugurou uma padaria que dá 5 pães, uma torneira que pinga água. No fim o jornalista que faz o programa apareceu como deputado, porque fez um bom trabalho.
F8 – De resto, está em funções desde 24 de Maio de 2011. Pelo que entendo, carrega consigo uma mágoa interna, mesmo no quadro dos seus princípios políticos ou ideológicos. Vai conviver com mais de cento e poucos deputados do MPLA, como será?
MK – Para ser sincero, não estou muito a vontade neste tipo de tribunal, porquê? Neste tipo de Parlamento que se quer democrático num país que se quer de direito, e de economia de mercado, num mundo moderno, os debates não são transmitidos na íntegra e em directo pela comunicação social, isto me choca muito. Este regime do MPLA se dá ao luxo de transmitir qualquer jogo do Benfica de Portugal, uma simples visita de um contino ou de uma empregada de limpeza do MPLA, simples brincadeiras, exemplo Gira-bairro, quando debates de um órgão legislativo de soberania, o maior órgão do poder de Estado, escondem. O que é que realmente querem esconder? A outra coisa que choca, desculpe, não estou contra ninguém, mas se houvesse eleições livres, com candidaturas livres e individuais, muitos nem dois votos poderiam conseguir na sua verdadeira casa. O MPLA atribuiu-se aquela maioria para fazer esta confusão toda e nos impor esta Constituição fabricada.
Jurei fidelidade mas nunca vou reconhecer esta Constituição
F8 – Está a dizer que a maior parte dos deputados do MPLA, não correspondem com a vontade do Povo?
MK – Eles não representam o povo. Pergunta só na tua província de origem, em Benguela, um parente teu ou amigo quem são os deputados que estão na Assembleia? Eu sou da província do Zaire, pessoalmente não conheço quem são os deputados da minha província. Outra coisa que queria dizer: a quando da tomada de posse chamaram-me para ir a frente jurar fidelidade, um deputado do MPLA perguntou-me. Também há aqui um panfleto do MPLA, o Jornal Independente, que questionou, se o Makuta que não reconhece a Constituição vai jurar fidelidade, vamos ver. Quero dizer, bem alto: jurei fidelidade, mas nunca vou reconhecer esta Constituição. Para mim esta Constituição é um Estatuto do MPLA. Mas devo respeitar e obedecer esta Constituição. Uma coisa é obedecer, cumprir, outra coisa é reconhecer. Mesmo o povo angolano obedeceu, respeitou e cumpriu a Constituição de Salazar e Caetano que transformou Angola de colónia à província de Portugal e o próprio angolano a português. Isto não quer dizer que o angolano reconhecia a Constituição portuguesa, era obrigado a respeitar. Não reconheço isso, porque desculpem, isto não é uma Constituição, é uma confusão.
F8 – Sente-se mais útil como deputado e na Casa das Leis ou fora como comunicador e analista?
MK – Esta é que e a pergunta central. Se dependesse da população, dos meus amigos, dos parentes, eu não devia aparecer naquela Assembleia. Primeiro é que toda gente está a temer que eu seja morto por envenenamento, através do micro da Assembleia Nacional, através da casa, caso me derem, ou através da viatura, porque são coisas que ainda não vi. Estamos em Junho, ainda não tenho, nem casa, nem salário. Há pouco, o guarda não me queria deixar entrar porque os deputados têm carro próprio e eu ainda não tenho este carro. A população também não quer porque como analista político, eu defendia a população e nesta Assembleia, as pessoas não sabem se existe deputado, tudo é secreto, nisto o MPLA é maligno. É estratégia do MPLA, como os debates não são transmitidos em directo, o povo não acompanha nada. Mas, pelo que se sabe, como deputado, não há incompatibilidade, ao mesmo tempo ser intervencionista. Todos os santos dias recebo queixas de tudo o que se passa em Angola e de pessoas que me pedem para abandonar o Parlamento, mas eu já reflecti. Devo muita gratidão a Samakuva. Nunca pensei ser deputado, não estou aí para benesses, penso que na qualidade de deputado poderei ser mais eficiente, receber do povo, encaminhar em directo na Assembleia e voltar a transmitir ao povo, é esta na regra da democracia o papel de um deputado. Mas que fique bem claro: muitos pensam que Makuta Nkondo entrou no Parlamento por favor do MPLA. Enganam-se. Deputado não é função pública, não é ser empregado do Estado, é um direito legítimo quando o processo é limpo.
O MPLA finge trabalhar bem, finge mudar, mas não muda
A oposição deve recorrer a manifestação
F8 – Outra questão, diz que o MPLA tem todos os adversários como inimigos e é intransigente naquilo que decide. Acredita que é útil continuar a debater, já que e pelas suas palavras, o MPLA passa por cima de tudo?
MK – O MPLA finge trabalhar bem, finge mudar, mas não muda. O MPLA vai fingir discutir a Lei Eleitoral. Aquilo não se aplica. A oposição também tinha projecto de Constituição. Houve fingimento de discussões e no fim, o MPLA apresentou a cartada dele, é a Constituição dele que passou. Aquilo que o MPLA quer é o que deve ser. O MPLA só tem medo, luta para evitar o suicídio, com esta nova conjuntura política que ultrapassa as alegações de não ingerência, a comunidade internacional, o Tribunal Penal Internacional, agora não está para brincar.
F8 – Que medidas deviam ser tomadas em relação aos ataques as mortes de militantes. O que devia se fazer para que tivesse impacto, já que a nível interno é ofuscado?
MK – Eu até gostaria que isso fosse o título da sua entrevista. A oposição deve recorrer a manifestação. Não são aquelas manifestações de vir a imprensa dizer: manifestação pacífica. Aquele termo demonstra o medo, a fragilidade. Têm de fazer manifestações tipo da Europa, ou do Norte de África. Há um primo meu que, por sinal não estudou, me disse: estou a respeitar os árabes. Porquê? Até mais velhos octogenários, mulheres com crianças a amamentar a participarem nas manifestações, durante semanas sem arredar o pé. Isto é inédito, mulheres encostadas aos tanques de guerra, do jamais visto. É isso que deve haver. O MPLA não ouve outra linguagem, esta linguagem de negociações o MPLA não respeita, despreza. As negociações é só para fingir, para fazer adormecer as pessoas de pé. Só a passeata que a UNITA fez, amedrontou o MPLA. Mesmo as manifestações da juventude, o MPLA está a tremer. Por isso vamos negociar na Assembleia, mas aqui fora na rua tem de se fazer pressão e a UNITA que incorra no erro de dizer que não vamos aderir a manifestação dos jovens porque a UNITA não vai a reboque, ou a UNITA é que lidera e os jovens é que são atrelados. Que não cometa este erro. Toda a manifestação é bem-vinda. Eu, Makuta Nkondo apoio e continuarei a apoiar todo o tipo de manifestação contra o MPLA, para corrigir as coisas.
F8 – Mas vai ser considerado indisciplinado porque no quadro da Assembleia há um Regulamento Interno que deve ser cumprido.
MK – Eu ainda não li na Constituição um parágrafo que proíbe manifestações. Também não li um parágrafo que proíbe um deputado apoiar as acções do povo.
F8 – O deputado Kamalata Numa, seu colega, por sinal Secretário-geral da UNITA, foi condenado e continua com o Cartão amarelo, só por ter manifestado com a greve de fome.
MK – Exactamente, por isso que eu disse, para o MPLA não há adversários políticos, há inimigos. Porque aquilo que fez Kamalata Numa e a greve de fome, é aquilo que assistimos diariamente lá fora, no mundo realmente democrático, manifestações, greves de fome, abandonos de sessões de Parlamento quando não se concorda com a matéria discutida. Estes são os ingredientes da Democracia. Mas aqui não é possível, porque aqui não há democracia, o MPLA considera Angola como propriedade dele, como Bikini, até as cuecas têm mais valor. E nós os angolanos, mesmo vivendo em Angola, à tudo pensamos que estamos a beneficiar dos favores do MPLA e não porque é direito nosso.
F8 – E como é que a sociedade civil, as organizações humanitárias devem se comportar face a esta realidade?
MK – Tenho dificuldade de definir o que é sociedade civil em Angola. O representante do Bloco Democrático em Benguela quer processar a AJAPRAZ por uso e abuso dos bens do Estado em nome de um Partido Político e de um Presidente de um Partido Político, MPLA e Eduardo dos Santos. Eu ouvi um elemento da AJAPRAZ a considerar de apartidária. Não há nenhuma Organização, “Não Governamental” dirigida por um membro do Comité Central do MPLA ou da UNITA e vem dizer apartidária. Porque o presidente da AJAPRAZ é membro do MPLA. 2 – Não acredito que estes jovens que estudaram na Zâmbia foram cavar diamantes e ouro para esbanjar tanta fortuna. O governo não consegue pagar salários, eles andam a distribuir mundos e fundos em todo o lado, em nome do MPLA e de José Eduardo dos Santos. Eu estou solidário com o BD e outros partidos, deviam seguir. E o General Numa também está de parabéns. Eu não sei se vai haver convivência no Parlamento. Eu ainda não comecei a intervir, estou a observar, a desmatar o terreno porque a pessoa não deve falar a toa. Encontrei quase todas as leis já foram discutidas. É como apanhar uma cobra no meio, não sei onde está a cabeça, onde está a cauda. Por isso, tenho que esperar aquela lei que vai começar na minha era, de princípio, para eu acompanhar e saber como vou debater.
F8 – Em relação a comunidade internacional. Dá-me a impressão que anda mais preocupada com os negócios e fecha os olhos para as atrocidades que se cometem aqui?
MK – Desculpe lá, é isso que não sabemos, porque, quando Barack Obama_ ainda agora falou mais, como dizia, pede a Kadhafi para sair com mais de 40 anos no poder, o Ben Ali, o do Yemen, Ali Saleh. Também quero felicitar os manifestantes Yemenitas, o presidente está ferido, mas é resultado da renitência dele, porque o Conselho de Cooperação do Golfe, pediu a ele para assinar um documento para sua retirada doirada com imunidade, ele brincou com a comunidade do Golfe. Estou a gostar da atitude da comunidade internacional e também das manifestações. Porque estão a servir de lições. Mubarak, ministros e filhos estão a correr o risco de Pena de Morte, por corrupção e por ter ordenado a morte de manifestantes. Também estava a ver um ministro da Tunísia levou 30 anos por desvio e corrupção.
F8 – E aqui em Angola?
MK – Pelo que vejo, os discursos de Obama, mesmo de Sarkozy, dá estimulo. Estamos a ver que no presente, nem o petróleo consegue travar a determinação do mundo acabar com as ditaduras e com os ditadores. Por exemplo, a Líbia em termos de quantidade e qualidade, o petróleo Líbio é mais. Mas ultimamente estamos a ver aqui desfiles de militares americanos. A política é complexa. Ou é Angola que é estratégico, ou é o governo do MPLA.
F8 – Não será porque a China surge agora como contra peso?
MK – A política é complexa e tem muita confusão, porque o MPLA nunca foi amigo da China, Angola sempre combateu a china por ter apoiado a UNITA e a FNLA. Aquele uniforme que veio com a tropa da FNLA em Angola em 1975, era da tropa chinesa. Quem treinou os soldados da FNLA em Kinkuzo foram instrutores militares chineses, quem treinou Savimbi e a direcção da UNITA foi a China. Porque o MPLA, vai lá onde a UNITA passa. O MPLA esteve na Côte d’Ivoire, não é porque se interessa com a Côte d’Ivoire, é cortar a retaguarda da UNITA, no Congo Democrático é a mesma coisa; invadiram o Congo e neste sentido está na China. O peso da China, eu não sei porque a China esteve também na Líbia. A China está em toda África. Não acredito que Barack Obama e Srakozy vão deixar este regime tirano e déspota do MPLA continuar a brincar com o povo angolano, continuar a escravizar os angolanos, por causa da China.
Vale a pena morrermos justamente do que ceder e trair
F8 – Mas o MPLA está a usar o princípio de: Não há amigos, nem inimigos permanentes.
MK – É isso que eu te disse. O MPLA é muito astuto. São os alunos de Maquiavel, até parece que já ultrapassaram o professor. Se Maquiavel estivesse em vida, é ele que seria aluno. Se Maquiavel não matou, MPLA massacrou. Aqui em Angola há aquela canção, a UNITA tem as mãos sujas de sangue, a UNITA matou no Zenza do Itombe. Eu fiz parte da UPA, conheço isso. Os três movimentos de libertação MPLA, UNITA, FNLA, cada um tem o seu passivo, os três mataram no Maquis. Os Miguéis, os Giboia, o MPLA matou, massacrou até enterrou membros da direcção vivos, até Viriato da Cruz tentaram assassinar. A UPA massacrou toda a direcção da UPA de Kinkuzo, nas vésperas dos acordos de Alvor, massacrou. A UNITA também massacrou, os Tito Chingunji, Sangumba, Chindondo, Wilson dos Santos, isto ninguém pode acusar ninguém. Voltando a guerra em Angola, a guerra só se faz a duas pessoas. A UNITA atacava, os aviões Migs, Sukóis e helicópteros do MPLA não iam distribuir sacos de arroz, pães, bidões de sumo, gasosas e rebuçados e quando os canhões Órgão Stalin, 40 canos do MPLA, não vomitavam água, nem chapas para as populações. Portanto ambas as partes matavam e destruíam, até o MPLA FAPLA é que usavam armas de destruição massiva, mais destruidoras. O genocídio que o MPLA perpetrou aqui em Angola no 27 de Maio, começou em 75 com a chacina no Pica-pau, contra os bakongos, acusados de antropófagos porque comem corações de pessoa, que foram massacrados aqui em Luanda, os da UNITA massacrados em Luanda, no Dondo. Se formos neste genocídio de 27 de Maio, não há nenhuma família que não ficou enlutada. Aquilo que o MPLA fez na sequência do dito fraccionismo, pode-se estar de longe superior a certos genocídios cometidos no mundo. É o mesmo genocídio cometido por Hitler na 2ª Guerra Mundial, por Stalin, na Bosnia, etc. Quem tem as mãos sujas de sangue, é o MPLA. Se for para reformular a história, o MPLA não tem espaço. E o que mais surpreende, os assassinos continuam a andar a vontade, são dirigentes e governantes que passam a vida a acusar os outros, a quererem de forma arrogante e ostensiva dar lições de bons rapazes e de cortesia. Se se fazer o recenseamento das vítimas e dos assassinos para ver quem é quem em Angola, precisamos de uma Comissão de diálogo, justiça, verdade e reconciliação nacional. Mas não devem anular o julgamento nos tribunais internos, deve se estender ao Tribunal Penal Internacional.
F8 – Para terminar, que futuro para Angola e qual será de facto seu comportamento como deputado?
MK – Para Angola não há futuro com José Eduardo dos Santos e o MPLA no poder. Nunca o MPLA vai conseguir nada que não conseguiu fazer durante cerca de quarenta anos de poder. O Santos e o MPLA, provaram que não são soluções para Angola, são problemas. Todos os problemas que Angola vive são de autoria de Eduardo dos Santos e do MPLA no poder. Com o MPLA não haverá esperança.
F8 – Estas medidas que são tomadas agora, aumentos salariais, algumas unidades fabris, não têm impacto positivo?
MK – Não são medidas, não têm impacto, não vai haver nada. O MPLA pode dar salários de um milhão de kwanzas a cada cidadão, naturalmente o pão vai custar mais do que um milhão de Kwanzas. O MPLA está a fingir, e os operadores económicos vão fazer subir as coisas. Também um pai quando compra mata-bicho para os filhos, não deve ser notícia. Porque isto é dever do pai. Um governo que dá de comer a sua população, se for notícia, não é governo, é um grupo de aventureiros. Dar de comer ao povo, isto é tarefa de qualquer governo do mundo. Por exemplo, não há publicidade com o governo sul-africano e namibiano, mas se você chegar a Namíbia qualquer trabalhador até empregado de limpeza a vida dele é igual a de um ministro de Angola, mas não há publicidade. Mínima coisa publicidade, inaugura uma ponte publicidade, qual é a tarefa do governo, isto é normal, não é notícia. Quanto ao meu futuro como deputado, eu estarei lá. Fui ao Parlamento, vou repetir, não é para ganhar benesses, não é para ganhar salário, carro bonito. Se me derem não vou recusar, é um direito. Isto não vai mudar nada em mim, dentro da justiça. Para mim, não há assunto tabu. Se tiver tempo, mas também só dão 8 minutos a UNITA, aquilo que eles consideram tabu, vão ouvir sair da minha boca. Estou ali para defender o povo e é preciso sublinhar que o povo para mim é o indígena, o autóctone, esses a quem lhes foi roubado o poder, que não mandam em Angola, que foram transformados em lixo. Hoje em dia o povo angolano não tem poder, quem manda nas FAA, no exército angolano, não são os filhos da terra, na polícia quem manda não são os filhos da terra, ali na presidência da República, a partir do Presidente, seus conselheiros assessores e tudo, não são angolanos genuínos. Eu não conheço, tenho dificuldades de reconhecer. Na bancada parlamentar do MPLA, quantos são os deputados angolanos genuínos que estão lá e dentro do MPLA, quem são os angolanos genuínos que mandam? No Congo Democrático no exílio, o MPLA não era tido nem achado, era considerado “Kimvuka Kia Mindele”, filhos dos brancos e usavam os poucos negros que estavam lá para fazer a sua propaganda, hoje esses são abandonados. O MPLA abandonou até os antigos combatentes da guerra colonial, os antigos combatentes das FAPLA, todo o mundo. Na administração quem manda, no governo quem manda, nos bancos, na Sonangol, todo sector de vida em Angola até governadores genuínos são relegados para o terceiro lugar. Portanto a minha luta é esta é resgatarmos o nosso poder. Esta terra pertence-nos, temos de levantar a cabeça. Vale a pena morrermos justamente do que ceder e trair as terras que os nossos antepassados nos legaram. Esta é que vai ser a minha luta no Parlamento se tiver espaço.
Porquê Makuta Nkondo hoje
Retrato histórico, na primeira pessoa do singular:
- Sou Augusto Pedro Makuta Nkondo, filho de um camponês, nunca fui rico. A minha vida é plena de hostilidades e peripécias. Tive sempre dificuldades na vida, simplesmente porque sempre gostei de defender pessoas. Quase nunca terminei uma função, sobretudo aqui em Angola. Entrei em Angola de volta da RDC, como comissário político da UPA-FNLA, na minha comuna de Kiximba. Mesmo lá em Kiximba tive problemas com a própria FNLA, nomeadamente com um dos comandantes ou com a UPA em geral. Eu não gostava da hostilidade entre a FNLA e o MPLA. Não vai acreditar, encontrei um senhor muito inteligente que era o representante do MPLA no Tomboco, chamava-se Caetano, trabalhava no Posto administrativo de que depende a comuna de Kiximba. Apreciava o homem, fiz-me amigo dele e esta amizade era muito mal vista pela FNLA, como é que eu, comissário político de Kiximba era amigo de um representante do MPLA?
Uma vez saí do Congo Democrático com uma coluna, fui buscar os refugiados angolanos oriundos de Kiximba, ao chegar ao Tomboco era já um pouco tarde afinal haveria escaramuças em retaliação ao que o MPLA fez contra a FNLA aqui em Luanda, principalmente contra os bakongos. Logo a FNLA devia vingar-se. Procurei pelo Caetano, representante do MPLA no Tomboco, não consegui encontrar, só mais tarde ouvi dizer que foi morto, não gostei. Isto custou-me caro. Não vou alongar muito e mais tarde com esta hostilidade fui transferido compulsivamente e exonerado do cargo de comissário político de Kiximba e transferido para o Norte. Mesmo no Nóqui onde fui transferido como responsável pela propaganda e mobilização, fui muito combatido.
Quando cheguei ao Congo, eu trabalhava também no governo congolês antes de vir a Angola e fui retomado no governo. No entanto, com um grupo de jovens intelectuais angolanos residentes em Matadi, entendemos criar um grupo de acção de Matadi. Fui indicado para ser o coordenador do grupo de obediência do MPLA. Com este cargo fui preso pela segurança zairense, estive numa prisão subterrânea em Matadi e graças a intervenção do meu director e de um parente dele, fui solto e daí tomei a decisão de regressar a Angola.
Logo que voltei a Angola em 18 de Janeiro de 1978, no Mingenge fui agredido por um elemento da ODP – Organização de Defesa Popular do MPLA que me considerou ser da UPA – FNLA, agente do imperialismo americano, inimigo do povo com todos os adjectivos, me agrediu física e verbalmente. A partir daí, mudei de ideias, questionei: como é que um indivíduo que estava a me insultar, no Congo Democrático considerava-se zairense, agora que é da ODP – Organização de Defesa e Segurança do MPLA, é ele que é mais angolano do que eu; depois este MPLA que quero apoiar, me considera estrangeiro na Pátria dos meus antepassados. A partir daí, renunciei totalmente o MPLA, porque um partido que considera os filhos da terra de estrangeiros, e os estrangeiros como donos da terra; a inversão dos termos é muito abominável, nunca vou perdoar isto ao MPLA.
No Nóqui, apanhei a coluna, para Banza Congo. Posto lá, o Comissário provincial Almirante Dias entendeu que devia regressar ao Nóqui trabalhar na Administração Municipal. Lá a Segurança do Estado perseguiu-me para que fosse agente, porque tinha sido da FNLA. Eu disse: Eu Makuta Nkondo, não me conhecem. 1 – Comecei a observar como se trabalhava. Primeiro relatório que fiz ao Comissário provincial do Zaire, Almirante Dias e ao 1º Secretário provincial do MPLA, Jorge Barros Chimpuaty, denunciei toda a maldade da DISA, que violava mulheres e filhas alheias regressadas à sua pátria, os bens dos regressados expropriados, os moradores do Nóqui e os caçadores viam suas carnes desviadas. Denunciei aquilo e fui duas vezes preso pela DISA. 1º por ter denunciado as maldades da DISA, 2ª vez foi um americano que se identificou, outro de cor negra, não sei até agora qual era a sua identidade. Estavam numa pequena embarcação. Como sabe, o Nóqui faz fronteira com o Congo através do Rio Congo, a embarcação avariou, foi levada pela correnteza das águas para o lado de Angola. Foram imediatamente acusados de espiões. Naquela altura de inimizade Angola/ Zaire, em 1978, alegavam tratar-se de um truque, a embarcação não tinha avariado. Foram detidos, amarrados, torturados, e o Administrador do Nóqui não se encontrava e quem lhe substituía era o coordenador municipal do MPLA, mas no entanto, no lado da administração eu era o escriturário dactilógrafo de 2ª Classe. Em nome da administração não concordei, prenderam-me e transferido para Luanda. Em 1979, fui admitido na ANGOP. O estágio terminou em Março de 1980. Trabalhava lá e na falta de residência, o director geral da ANGOP, o João Melo colocou-nos nos hotéis. Eu vivia no Hotel Panorama. Naquele tempo no hotel panorama viviam poucos negros. Foi onde conheci o primeiro secretário da embaixada do Zaire em Angola, quem chamávamos “Citoyen Koy”, cidadão Koy. Saímos do Hotel Panorama, transferidos para o Hotel Trópico, junto outro negro que era o embaixador da Nigéria. Mais tarde este citoyen Koy, arranja uma casa. Um dia convida-me a conhecer a casa. Exactamente no dia em que fui visitar o Citoyen Koy, passo pela casa de um conterrâneo meu de nome Madeira que era piloto de Mig, que também mostrou interesse. Não sabia que era proibido um piloto visitar os diplomatas. Fomos muito bem, regressamos. Certo dia estava a trabalhar na ANGOP, fui preso, apareceram os elementos da Segurança do Estado e fui levado as instalações da Segurança do Estado, frente ao Cemitério da Sant’Ana, na estrada de Catete, chamava-se nas “Operações”. Fiquei na cadeia subterrânea 5 meses, de Maio a Outubro, acusado de espionagem, traição a Pátria, elemento subversivo, agente do imperialismo Yankee. O que me surpreendeu, fui eu preso, um dos comandantes da Marinha, aquele piloto, mais um outro, Paul Nkanga, que era piloto do SU-22. Esse piloto do SU-22 na altura estava a fazer protecção a visita do presidente a Huíla. Em pleno voo enviaram-lhe uma mensagem dizendo que estavam a notar uma avaria no motor, ordenaram-lhe para aterrar. Assim que aterrou, foi imediatamente preso. Muita gente presa, até religiosos, gente que nem conhecia, o chefe era eu, mas não sabia do que se tratava. Na prisão não queriam me dizer nada, só estavam a interrogar-me. “Se já fizeste parte de um Partido político angolano fantoche? Eu disse não, eu nunca fiz parte de um partido fantoche, mas fiz parte de um partido que libertou Angola. Se tu estás aí escrever, é graças aquele Partido. O agente perguntou-me: Qual é? – É a UPA FNLA. – Para o senhor é a UPA que libertou Angola, não é o MPLA? – Com a idade que tenho, estive no Congo Democrático, não sei nenhuma história da luta de libertação de Angola por parte do MPLA e se o MPLA que libertou não sei, mas eu fiz parte da UPA. Portanto, fiquei aí, conheci o Mwanga Jhomo Kenyata que dizia ser filho do antigo presidente Jhomo Kenyata, era perseguido pelo presidente Arap Moy, alegava que Mwanga queria lhe derrubar, tinha uma mulher americana, fugiu com o Jeep dele pela via da fronteira de Nóqui e Mbanza Congo. Em 1985, estive na mesma prisão com o Lameira da UNITA que foi capturado. Estive preso em Maio, saí em Outubro com o André Lina, presidente do MUSA – Movimento Unificado Socialista de Angola, era Oficial das Forças Armadas, acusado de ter atentado contra a vida do Presidente quando visitou o Soyo, estava também com Abrantes igualmente acusado de ser espião. Não sei o destino e paradeiro deles hoje. Uma longa história, muito sofrimento.
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