domingo, 26 de fevereiro de 2012

João Melo e o “adiamento das eleições”. Mihaela Webba*


Fiquei à espera, durante algumas semanas, para ver um deputado ou um jurista do partido MPLA vir a público repudiar a posição ilegal do Conselho Superior da Magistratura Judicial de ter considerado magistrada judicial a Dra. Suzana Inglês, que a sociedade conhece como uma advogada politicamente alinhada. Ninguém veio.
Com a exibição do Diário da República nº 9, II Série, de 4 de Março de 1994, ficou provado que o CSMJ defraudou os angolanos quando afirmou que o despacho de exoneração da então Juiz Suzana Inglês nunca fora publicado. Fiquei à espera que pelo menos um Deputado do MPLA defendesse o povo e a lei, e não a ilegalidade e a fraude, pelo silêncio. Ninguém veio.
Fiquei triste, porque dos 191 Deputados do povo eleitos pela lista do MPLA nenhum se levantou para defender aquilo que jurou defender quando tomou posse. Sinto que Angola inteira ficou triste não só com os deputados, mas também com a jurista Suzana Inglês, porque, afinal de contas com o seu gesto, ela disse à Nação que, se o seu Partido violar a lei, ela vai defender o seu Partido e não a lei. Ela disse-nos que se o seu Partido mandar-lhe defraudar as eleições, ela vai fazer isso. Ela disse aos seus filhos, sobrinhos, netos, alunos, afilhados e membros da sua paróquia, que, infelizmente, a defesa da legalidade, da dignidade e da honra pessoal, não são mais virtudes a preservar em Angola. Porque o MPLA, que antes dizia não haver Deus, agora quer que todos nos comportemos como se não houvesse mais lei.
Decidi terminar o tempo de espera quando li as quatro perguntas prévias que o Deputado João Melo formulou com ironia para provar a sua tese segundo a qual a “oposição radical” estaria muito interessada no adiamento das eleições da mudança. Vou responder ao Deputado:

Primeira pergunta: Quem tem usado sistematicamente a estratégia da cadeira vazia, no parlalmento, quando se discutem as leis que deverão regular as eleições?
João Melo fala muito de “política de cadeira vazia”. O Deputado parece não ter percebido ainda que os Parlamentos democráticos são fóruns de discussões, negociações e de manifestações políticas. Nesses fóruns, os representantes eleitos pelo soberano, são livres e soberanos para manifestar de várias maneiras o seu repúdio às diversas agressões aos direitos do soberano. Podem fazê-lo através do silêncio, do abandono das sessões ou mesmo pela simples não comparência. Estas formas de boicote concretizam um direito, sim, o direito ao boicote. O direito ao boicote e o direito à greve, são manifestações do direito à liberdade de participar ou não participar das reuniões e das decisões. Esses direitos são exercidos soberanamente pelos povos, dentro e fora das instituições do Estado.
Na presente legislatura, os deputados do povo eleitos pela lista da UNITA, exerceram o direito ao boicote duas vezes, primeiro em Janeiro de 2010, aquando da aprovação da Constituição autoritária de 2010 e no final de 2011, aquando da violação do artigo 107º da Constituição pelos Deputados eleitos pela lista do MPLA. Se todos os deputados, tivessem a coragem de defender a Constituição e a lei como fazem os deputados eleitos pela UNITA, boicotando as farsas legislativas, já o regime de JES teria caído.

Segunda pergunta: Quem tem levantado suspeições infundadas acerca da lisura das eleições, quando as mesmas ainda nem sequer tiveram lugar (estratégia da «fraude por antecipação»)?
A preparação das eleições já começou há muito. Quem é que se tem comportado de modo a criar suspeições? Quem é que não quis e não quer de facto constituir a Administração Eleitoral Independente prevista na Constituição? Quem é que tem orientado e protegido a recolha coerciva de dados eleitorais dos cidadãos? Quem é que tem medo que os cidadãos eleitores façam uma auditoria dos seus próprios dados armazenados pelo Executivo no Ficheiro Informático Central do Registo Eleitoral? Quem é que manipulou os programas informáticos em 1992 e consentiu pelo silêncio ter organizado uma fraude eleitoral, cujo núcleo central foi confirmado recentemente por peritos independentes? Quem é que, através da sua Casa Militar, usurpou as competências da CNE em 2008 e operou outra fraude eleitoral? Quem é que produziu mais de 12,000 actas ilegítimas em 2008 e atribuiu matematicamente aos concorrentes votos falsos? Quem é que já infiltrou agentes secretos na CNE e não só e os está a preparar para operar a terceira fraude eleitoral agora em 2012? Quem é que, depois de aparentemente ter aceite a ideia de uma CNE independente, vem agora tentar controlá-la por via da figura do seu Presidente, o qual se pretende utilizar como simples marionete para sancionar a fraude? Quem é que manipula o Conselho Superior da Magistratura Judicial e força-o a violar a lei?
Aí faço minhas as palavras do Deputado: “A opinião pública conhece as respostas”.
Terceira pergunta: Quem tem apresentado reivindicações não previstas na lei (por exemplo, fazer tábua rasa do princípio democrático da proporcionalidade), uma após outra, o que só não tem provocado o bloqueio do processo, devido à flexibilidade do MPLA?
Aqui importa esclarecer de uma vez por todas um equívoco muito comum no Parlamento angolano: o princípio jurídico da proporcionalidade não é um princípio “democrático”, e nada tem a ver com a proporção aritmética ou geométrica do número de deputados de cada bancada. O princípio da proporcionalidade (ou da razoabilidade, como prefere o direito norte-americano; ou da proibição de excesso como também é denominado pelos alemães) enuncia a ideia de que as competências administrativas só podem ser validamente exercidas na extensão e intensidade proporcionais ao que realmente seja demandado para cumprimento da finalidade de interesse público a que estão atreladas. Segue-se que os actos cujo conteúdo ultrapassem o necessário para alcançar o objectivo que justifique o uso da competência ficam maculados de ilegitimidade, porquanto desbordam do âmbito da competência; ou seja, superam os limites que naquele caso lhes corresponderiam.
Nesta medida, o princípio da proporcionalidade tem por escopo – como sua designação deixa antever – a vontade de evitar resultados desproporcionais e injustos, baseados em valores fundamentais conflituantes, ou seja, o reconhecimento e a aplicação do princípio permite vislumbrar a circunstância de que o propósito constitucional de proteger determinados valores fundamentais deve ceder quando a observância intransigente de tal orientação importar na violação de outro direito fundamental ainda mais valorado.
No tocante a sua origem, Gomes Canotilho ensina que “o princípio da proporcionalidade dizia primitivamente respeito ao problema da limitação do poder executivo, sendo considerado como medida para as restrições administrativas da liberdade individual. É com este sentido que a teoria do estado o considera, já no século XVIII, como máxima suprapositiva, e que ele foi introduzido, no século XIX, no direito administrativo como princípio geral de direito de polícia. [...] Posteriormente, o princípio da proporcionalidade em sentido amplo, também conhecido por princípio da proibição de excesso, foi erigido à dignidade de princípio constitucional em meados do século XX, na Alemanha”.
A promulgação da Lei Fundamental de Bonn representa, assim, marco inaugural do princípio da proporcionalidade em âmbito constitucional, ao colocar o respeito aos direitos fundamentais como núcleo central de toda a ordem jurídica.
No entendimento de Humberto Bergmann Ávila, a proporcionalidade, então, "destina-se a estabelecer limites concreto-individuais à violação de um direito fundamental – a dignidade humana – cujo núcleo é inviolável". A função primária do princípio da proporcionalidade, explica, é pois preservar os direitos fundamentais, resguardando-os de restrições desnecessárias. É garantir que haja sempre uma razoável correspondência entre a intensidade da sanção que se pretende aplicar e a acção que se objectiva punir.
Nestes termos, devemos concluir que não só é falsa a premissa da pergunta do deputado, como também é falsa a acusação que faz, porque de facto a oposição não tem feito reivindicações não previstas na lei. Todas elas estão previstas na lei. Por exemplo: uma CNE independente do Executivo, está prevista no art. 107º da CRA. Um magistrado judicial em funções para presidir a CNE independente, está previsto no art. 143º da Lei nº 36/11, de 21 de Dezembro; o direito dos cidadãos auditarem os programas informáticos que o MAT utiliza para guardar e manusear os dados do registo eleitoral, está previsto nas disposições combinadas dos artigos 40º (liberdade de informar, de se informar e de ser informado) 69º (Habeas data) e 200º, nº 4 (direitos e garantias dos administrados), todos artigos da nossa Constituição; a não interferência da Casa Militar do PR na organização das eleições, está prevista no art. 107º da CRA e no art. 139º da Lei nº 36/11. A obrigação do deputado João Melo – e outros – repudiar a decisão ilegal do CSMJ de designar Suzana Inglês para o cargo de Presidente da CNE, está prevista no artigo 143º, nº1 a) da Lei nº 36/11. O direito de os Partidos Políticos abandonarem toda e qualquer sala onde se orquestra a violação do Estado de direito e de boicotar a realização de qualquer eleição não democrática, inconstitucional e ilegal em Angola, está previsto nos artigos 4º, 6º e 17º da CRA.
Além disso, é preciso recordar que na definição das regras eleitorais, não há maiorias nem minorias. Para efeitos eleitorais, todos os Partidos são iguais e partem iguais para a competição. É como no futebol: só porque o Libolo ganhou o campeonato no ano passado, ele não deve partir para o próximo campeonato em vantagem em relação aos outros clubes. Senão seria o eterno vencedor antecipado.
Quarta pergunta: Quem tem chantageado o partido no poder, ameaçando organizar manifestações de rua se o MPLA não ceder a tais reivindicações?
Esta não merece resposta. Se nesta altura do campeonato, o Deputado João Melo, considera que o exercício de um direito fundamental como o direito à manifestação, ou o direito à greve, é uma chantagem, então ainda não considera que os angolanos são livres e independentes! Terá de aguardar pela próxima revolução!
Em síntese, se através do Semanário Angolense, o regime pretendeu lançar a ideia de que as eleições da mudança são adiáveis, ao Deputado João Melo coube a proeza de mais uma vez transformar a vítima em ofensor. Se no passado o regime do MPLA utilizava as técnicas de comunicação para transformar mentiras absurdas em verdades e formatar mentes incautas, hoje pretende fazer o mesmo contando com as mesmas pessoas e utilizando as mesmas técnicas. É como dizia uma gravação que ouvi há dias: “estes tipos não mudam”!
*Jurista

Um comentário:

  1. medianteb os relatos e a coragem dos patriotas do folha 8 na luta da democracia em angola desejovos sorte e a nao preceguicao. bem eu tenho um alento a deixar olha no principio do mes de marco inagorou-se a missao adeventista do BONGO no HUAMBO no municipio do LONGONJO,para minha surpresa e que depois de um mes os alunos continuam sem professres, as unicas aulas pra esses cidadao sera apenas a resa do pai nosso. que angola e essa? sera isso corecto? e os encarregados que enviaram os seus popilos sabem disso? SE O GOVERNADOR DA PROVINCIA DO HUAMBO E QUEM INAGOROU SABE DESTE PROMENOR? se sabe ou nao aqueles estudantes estao condenados a bebedeira e a prostituicao se entendem a sutilesa. outro facto que se coloca consiste no facto dos professores que estavam pra se apresentar sao funcionarios publicos que vao para la sem onorarios. Ainda assim a qualidade de ensino que tanto se fala desses centros religiosos estaria preservada?. contudo meus senhores, minhas senhoras, angolanos e todo resto vao la ver a realidade, de mais UM enganador que quer ser rico sem esforcos. esse e o meu descontentamento e espero que isso possa passar em todos que lutam pela igualdade de direitos e deveres em angola, que a paz esteja com todos os angolanos.

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