O ditador Kadafhi converteu a República Árabe da Líbia em menos de uma semana num dos palcos mais sangrentos entre todos aqueles que, na África do norte e Médio Oriente, clamam pela chama da mudança do regimes que se encontram por mais de 30 anos consecutivos no poder. Infelizmente existem muitas semelhanças com o que se passa em Angola. No entanto os mortos civis contam-se por centenas, cerca de 750, para além de milhares de feridos na sequência de uma implacável e desesperada repressão militar, levada a cabo por militares e mercenários, contratados pelo regime de Kadafhi para bombardear contra o seu próprio povo, que se manifesta por mudanças, num país dirigido à mais de 42 anos por uma ditadura, que sustenta as suas excentricidades com base nas enormes reservas de petróleo, que "banham" o seu deserto.
Willian Tonet*
Num país tão hermeticamente fechado a informação como Líbia, onde os órgãos de comunicação social, são rigorosamente controlados pelo regime, os jovens manifestantes, cuja onda de solidariedade tem estado a aumentar, conseguiram passar ao mundo as imagens dos massacres das tropas do ditador. No entanto Bengasi, pese os tumultos, já está na mão dos manifestantes revolucionários da mudança, enquanto Tripoli, os manifestantes continuam a enfrentar as tropas fiéis a Kadafhi e família, num autêntico cenário de guerra, que se espalham por todo o país. O regime monolítico teima em não sair e não se importa de para isso contratar toda gama de mercenários pagos a peso de ouro para manterem, mesmo contra a vontade popular se manterem no poder, instalando o caos num país que tem um peso relevante na venda de petróleo no mercado mundial.
Antes de uma eventual renúncia, fuga, num acto cobarde o ditador está a adoptar uma política de terra queimada, atirando contra e todos e contra todos, que se movem e gritam por mudanças, sacudindo os pilares de um regime que se julgava sólido, mas que se vê as suas fragilidades, ante a este movimento pacífico das populações, discriminadas nas suas principais aspirações de mais liberdade, respeito pelos Direitos Humanos e democracia, o acto proclamado guia da revolução, responde com balas, contra o próprio povo. Mas para o mundo não é surpresa, pois o líder líbio é um dos principais financiador do terrorismo mundial, logo com as mãos sujas de sangue de inocentes, não lhe faltam alguns generais, que mesmo no fim de ciclo se predisponham a esse trabalho sujo, contrariando o exemplo dos militares da Tunísia e do Egipto, que se limitaram a proteger os manifestantes na justeza das suas reivindicações.
Recorde-se que nem mesmo quando, Saif Kadafhi, filho do tirano e sucessor designado, foi a televisão, controlada por ele, que o regime lutaria "até a última bala" contra os "elementos subversivos", os manifestantes não se retraíram e continuaram os protestos. Logo, as ameaças e as balas, já não conseguirão parar a vontade de mudança das populações, sedentas da partida deste regime, mesmo que seja o ditador júnior a tentar vir a público mostrar uma certa vitalidade, que vai faltando ao pai, mas ambos sem legitimidade, para se considerarem como donos da Líbia. Mas antes e mais, quem pelo mundo ouviu as declarações do garoto, sentiu que ela denota a debilidade de um poder, cujo povo já não o acredita e está saturado das suas promessas e política opressora.
Seguramente, se recordarmos, que toda esta corrente revolucionária aconteceu quando em 17 de Dezembro de 2011, um vendedor ambulante de frutas tunisino, Mohamed Bouazizi, se imolou, em sinal de protesto de protesto pela actuação dos agentes da Polícia que os prendiam e roubavam o seu negócio, ninguém acredita ou teria vaticinado, que estaria ali o rastilho de uma revolução que o Médio Oriente e a África careciam e que seguramente, vai mudar o mapa geoestrátegico dos regimes que se querem perpetuar no poder e subverter a democracia.
O que aconteceu na Tunísia é um acto que a fiscalização angolana faz todos os dias, quando espanca, mata e rouba os produtos dos vendedores de rua, Estes autóctones foram atirados ao desemprego fruto das más políticas de gestão económica de um regime, que privilegia a mão de obra estrangeira e como tal é insensível com o sofrimento destas gentes, cujo crime é o de tentarem todos os dias, sobreviver com dignidade, para não integrarem os exércitos da delinquência e prostituição. No entanto, no pedestal da sua arrogância, cultura de violência e violação dos Direitos Humanos, o regime tem sido o principal estimulador da violência, quando manda as suas tropas roubarem, prenderem ou matarem, sanguinária e injustamente, os produtos de gente pobre e honesta, que sustenta com o seu esforço e trabalho os seus filhos, mulheres e maridos, por o governo, pese os milhões do petróleo não lhes dar, sequer subsídio de desemprego ou de maternidade.
As principais partes do "ditadorzinho líbio", Saif el Islam Kadafhi
Quando a reforma iniciou, o filho do líder, o indicado como seu sucessor foi a televisão em tom ameaçador, passar a mensagem, que vamos aqui respigar os seus pontos mais importantes., já as suas tropas, tinham batido, melhor assassinado, friamente mais de 8 dezenas de inocentes.
- "Ao invés de chorarmos os 80 mortos dos últimos dias, se for instalado o caos, choraremos centenas de milhares dos nossos irmãos e seremos obrigados a fugir do nosso país".
- "Temos duas opções: ou actuamos todos unidos para aproveitar esta oportunidade e introduzimos reformas, o nos envolvemos com o caos".
- "Isto vai ser pior que a Jugoslávia e o Iraque. Vocês verão".
- "Vamos, o regime, lutar até o final. Não vamos deixar que se riam de nós nem a Televisão Al Jazira nem a Al Arabia nem a BBC".
- "Vocês de Bengazi não têm petróleo. De que acham que vão viver? Querem que se passe o mesmo que na Coreia do Norte e Coreia do Sul?".
- "Muamar Kadafhi está em Tripoli e dirige a batalha. E todos estamos com ele e vamos defender a unidade da Líbia até que um só homem fique de pé".
- "Estamos numa volta perigosa da história do nosso país. Antes de que todo o mundo pegue as armas e haja uma guerra civil e uma divisão na Líbia faz falta um debate nacional, com o que Kadafhi está de acordo, para passarmos a uma segunda república".
- "O Exército desempenhará um papel essencial para restaurar a segurança, seja qual for o preço a pagar. Se trata da unidade da Líbia".
- "O inimigo exterior, com o recurso ao Facebook, se uniu com a oposição interna para imitar o que ocorre noutros países árabes".
- "Os meios de comunicação exageram no número dos mortos".
- "O Exército está com Kadafhi até ao final. O Exército não está acostumado a dissolver os manifestantes. E num acesso de nervosismo, houve os tiros".
- "Os líbios que estão no estrangeiro dizem a vocês que se levantem, quando eles e os seus filhos vivem muito comodamente noutros países... Logo serão os que virão aqui em aviões para vos governar".
- "Haverá novas leis e um debate nacional sobre uma nova Constituição que se pode abrir a partir de amanhã se estivermos de acordo".
No entanto face a todas estas ameaças veladas e promessas, do filho do ditador e seu putativo sucessor, o povo líbio de tão descrente, não as deu importância e disse não ter nada a negociar com um regime que durante 42 anos apenas olhou para o seu umbigo e adoptou políticas inspiradas na visão de um homem só. Em função disso e de notícias que lhe davam em fuga, Kadafhi foi obrigado a falar e fé-lo no seu palácio em ruínas.
AVIAÇÃO E MERCENÁRIOS DISPARAM CONTRA O POVO
O regime de Muamar el Kadafhi, incrementou desde o dia 21.02 a sua campanha militar de bombardeamentos e ataques terroristas contra as populações indefesas. Os pilotos do regime, recorde-se que até ao momento desertaram 8 pilotos, tendo dois com os respectivos aparelhos fugido para Malta, por se recusarem a lançar bombas contra o seu povo. As ruas de Tripoli estão a ser patrulhadas por mercenários, com alguns fiéis ao ditador, com o objectivo de perseguir e matar os opositores do regime. "Os mercenários e os pilotos estão a disparar contra tudo que se move, numa autêntica carnificinia. Kadafhi é um assassino, um ditador, que deve ser julgado por crimes contra a humanidade. É isso que o mundo deve saber e condenar, neste regime de loucos, que querem depois deles queimar a Líbia, como se fosse sua propriedade privada", disse ao F8, Hammed Hayun.
Muitos trabalhadores internacionais face a situação, continuam a aguardar pela abertura do aeroporto para partir, sendo a maior comunidade a turca, mais de 3.000 que dormem no local com a expectativa de saírem do sufoco de um país que está em chamas, com as comunicações telefónicas em mau estado ou bloqueadas e a internet cortada, pois a operadora a exemplo de Angola é do filho de Kadafhi... A possibilidade de comunicação com o exterior deve-se ao facto de algumas pessoas terem ships telefónicos de empresas telefónicas da Tunísia e do Egipto e acercando-se das fronteiras desses países, conseguem passar as suas mensagens para o exterior "A situação é muito confusa, o regime perdeu o norte e está a atirar no povo nas ruas. Há muitos cadáveres nas ruas, que não são recolhidos e o lixo, amontoa-se também, face a violência", denunciou ao F8, Sunafim Barei; acrescentando que Kadafhi, "está a fazer um verdadeiro massacre e política de terra queimada".
"VAMOS MORRER MAS VAMOS RESISTIR"
Um jovem engenheiro informático líbio, Raima Ali garantiu ao F8 ter sido alvejado com dois tiros, um na perna e outro no braço, condenando por isso, algumas facções do exército do seu país, que se transformaram "em caudilhos da política assassina de um moribundo líder que quer ficar no poder com o sangue dos filhos deste povo". Na sua opinião esta revolução já não tem recuo e estão afastadas, depois desta chacina, "toda possibilidade de negociar com um regime assassino. Nós vamos resistir, somos líbios, por isso vamos lutar e morrer por esta terra, chega de termos medo, andarmos escondidos como se fossemos ratos".
No entanto o medo se espalhou por todas as ruas das cidades ainda sob controlo de Kadafhi. "Tripoli, está irreconhecível, parece uma cidade fantasmas, os mercenários estrangeiros nem falam árabe e o seu aspecto é mesmo de matadores. Por isso afirmo que Kadafhi é um tirano e com o seu filho e seguidores, formam um bando de assassinos sanguinários, que não lhes vamos deixar fugir do país, pois terão de pagar estas vidas que estão a assassinar".
Aeroporto de Bengazi, destruído
A situação em Bengazi radicalizou-se por na manhã do dia 21.02, a aviação de Kadafhi, ter bombardeado a pista do aeroporto, para inviabilizar, qualquer tipo de apoio, a aquela que é considerada, no leste da Líbia, o bastião da resistência contra o regime. "Isto é a demonstração do desespero de um regime em agonia, pois nós estamos a avançar para o controlo de Tripoli, depois de terem caído, com a ajuda do exército e polícia que abandonaram o tirano, para além de Bengazi, as provincias de Musratha, Tobruk e Sirte, a cidade natal de Kadafhi".
Ben Wedeman, um dos poucos jornalistas ocidentais da cadeia americana da CNN que conseguiu entrar na Líbia, confirmou a queda de Bengazi e o avanço da oposição para outras regiões e que "o exercito de Kadafhi, não está a dispersar as pessoas está a atirar a matar, numa autêntica carnificinia". No entanto as zonas libertadas do jugo ditatorial, estão a ser, provisoriamente dirigidas por comités populares e organizações de defesa, para manutenção da ordem e das instituições, no sentido de não se instalar a anarquia.
Kadafhi quer destruir a Líbia antes de partir
Omran Mohamed Omran, dissidente líbio denunciou o facto do "regime de Kadafhi estar a utilizar mercenários contra o seu povo. Não é uma guerra civil. É um massacre de um homem que está sozinho e tem uma premissa na cabeça: eu fiz este país eu vou queimá-lo", denunciou este jornalista líbio de 56 anos que vive em Málaga, Espanha e é representante naquele país da Coligação 17 de Fevereiro, o movimento popular que liderou o levantamento contra o regime de Kadafhi.
"Os mercenários são africanos, nem sequer falam árabe, patrulham as ruas metralhando qualquer aglomeração de gente, atacando hospitais e saqueando os lugares públicos para desestabilizar criar a confusão", denuncia Omran, assegurando que os cidadãos líbios decidiram criar grupos de vigilância para proteger os bairros e as instituições de pilhagens e assaltos, para depois os incriminar. "É horrível. Kadafhi utiliza aviões contra gente indefesa. Tenho informação que os cadáveres são muito mais que as cifras que se conheceme não podem ser recolhidos por familiares e vizinhos, porque o regime montou informadores ao serviço dos mercenários, que quando accionados, vão rapidamente, atirar contra quem pretenda recolher o seu ente querido", sentencia.
A Coligação 17 de Fevereiro tem este nome, por ser o dia de início desta grande empreitada, quando teve início, em toda Líbia o Dia da Ira; a semelhança do que acontecera nos países vizinhos. "O que queremos é fundar um Estado com democracia, direitos humanos, liberdade de expressão, de associação de imprensa. Queremos um Estado moderno não um Estado que vive na idade média. Queremos viver no século XXI não no século X.", conta.
Divisões no Exército
Segundo informações em posse do F8, existem profundas divisões na estrutura do Exército o que está a possibilitar a queda de muitas cidades e tudo por no dia 19, ter sido ordenada a detenção domiciliaria do chefe do Estado Maior do Exército, Abubaker Yunas, contemporâneo de Kadafhi que com ele participou no golpe de Estado de 1969 que o levaria ao poder, por se ter oposto ao líder líbio, numa reunião Em que se previa o discurso do filho do ditador, na TV, no dia 20.02. Na altura, Yunas pediu a Kadafhi que se afastasse do poder para cumprir com as recomendações do povo, mas Kadafhi respondeu que antes queimaria a terra que ele mesmo havia feito florescer. Pouco depois Saif el Islam, sucessor indicado pelo pai, assegurava na televisão que a sua família lutaria "até que caísse o último homem".
Isto criou um grande desânimo nas tropas e muitos quadros intermédios tomaram a iniciativa de desertarem, para não atirarem as suas balas contra as populações de onde são oriundos. Por seu turno o comandante dos pára-quedistas, general Abdul Aftah Yunes, próximo de Kadafhi, foi feito prisioneiro pelos manifestantes que o entregaram a guarda dos juízes, que se converteram em símbolo dos protestos ante o regime. "Em vez dos governadores de Kadafhi, são os juízes que dirigem e administram os povos e regiões já sob controlo dos novos revolucionários, porque gozam de respeito junto das populações", informa Omran. "Kadafhi disse ao povo: ou o seu regime ou a morte. E, nós escolhemos Eleger a morte antes que Kadafhi, por querermos viver livres e em democracia plena no século XXI".
Kadafhi nervoso com a queda de Bengazi, afirma: "Não me vou embora, morrerei como um mártir
A aparição do ainda presidente líbio no 21 foi vista como um desespero, para tentar frenar a fúria dos manifestantes, que querem a sua partida imediata do poder, a elaboração de uma nova constituição a instauração da democracia e o fim da corrupção. Com uma roupa tradicional castanha e semblante agastado, não era o mesmo homem que se apresentava a discursar. "Eu não vou partir com esta situação. Morrerei como um mártir", justificou zangado na sua longa intervenção descompassada, em muitos momentos, obrigando a televisão a ilustrar com imagens, enquanto o ditador procurava os papéis ou o seu livro verde. A comunidade internacional e as cadeias de televisão, árabes, americanas e europeias, foram a base das acusações dos acontecimentos, pois na sua opinião "eles trabalham para o diabo. Este é o nosso país é o país dos nossos avós. Não vamos deixar que o destruam", afirmou.
O ditador não havia feito nenhuma declaração oficial desde o início dos protestos, a para dos meios de comunicação passarem as suas excentricidades, como breves aparições noturnos em diferentes pontos de Tripoli, para dar a sensação de controlo da situação, que então já lhe fugia pelas mãos. Neste discurso no seu antigo palácio e que é apresentado como símbolo de resistência, contra o bombardeamento americano de 1986, o líder líbio tentou minimizar a situação que vive o seu país com os restantes da região, igualmente assolados por manifestações, como a Tunísia, Egipto, Bahreim, Argélia, que forçaram ou forçam uma mudança de regime e partida dos ditadores com mais de trinta anos de poder. "Os jovens que protestam não são culpados", segundo Kadafhi, acusando a oposição e a comunidade internacional de estar a distribuir "droga e dinheiro, para que os jovens se manifestem. Conhecem alguém decente que participe nisso? Não há! É gente que se droga e se embebeda", justificou acrescentando que "os líbios são livres uma vez que o poder está nas mãos do povo", assegurou, para quem não se importa, que nasça uma nova República e nova Constituição, mas com ele a cabeça, deste movimento. "Não sou presidente, sou líder da revolução", disse negando-se, caricatamente, a seguir os passos de Ben Ali da Tunísia e Moubarak do Egipto.
Porque ao mesmo tempo em que discursava, a sua aviação e os mercenários que chegavam ao país estavam a bombardear as populações, de acordo com os dados fornecidos pelos manifestantes e a Human Rights Watch, que afirmaram que desde o dia 20 as autoridades só em Tripoli, assassinaram mais de 100 pessoas. "Os que se levantam com armas contra o país serão condenados a morte", garantiu o ditador, acrescentando que "nem sequer comecei a dar ordens de usar balas; se necessitarmos empregar a força, a usaremos".
E para a suja empreitada chamou os seus partidários a defender o regime e a lutarem contra "os ratos" que estão a manifestar-se. "A luta se levará a cabo rua a rua até que o solo líbio seja libertado. Os que querem Kadafhi, formem comités populares e atem estes jovens em casa", sugeriu o ditador, ao que em Angola constitui o Movimento Nacional Expontâneo, de apoio exclusivo as políticas e acções do Presidente José Eduardo dos Santos.
Na opinião de Kadafhi o encerramento dos portos e aeroportos se deve ao facto de tudo estar bloqueado com as manifestações, inspiradas, na sua opinião, pelos Estados Unidos e a União Europeia. "Não há combustível, as pessoas têm medo e o culpado da situação são os EUA. Os mesmos que destruíram o Iraque, o Afeganistão, a Somália... são os que entraram agora na Líbia (...) No vou permitir que a Líbia se converta numa Faluya".
Contemporâneos e militares abandonam Kadafhi
O grande receio do regime líbio prende-se com o facto de no leste e parte do norte, a oposição ter montado o seu posto de comando, aliado ao facto do exército egípcio ter reforçado as suas unidades ao longo da fronteira comum, conferindo este acto, não só mais segurança aos manifestantes, como temor ao regime de Kadafhi, depois de a província de Bengazi, a segunda mais importante do país, ter caído nas mãos dos manifestantes, após o exército e a polícia nacional, terem retirado o apoio ao regime e integrado as manifestações populares, em solidariedade as reivindicações populares.
No entanto pelos actos de violência e contínuo bombardeamentos às populações a ONU exigiu uma investigação internacional. "A insensibilidade com que as autoridades líbias e os seus mercenários armados disparam rajadas contra os manifestantes pacíficos é inconcebível", asegurou a alta comissária para os Direitos Humanos, Navi Pillay Pillay. O representante líbio nas Nações Unidas, um dos seus melhores amigos e que em 1969, com ele deu o golpe de Estado e o na Liga Árabe, Abdel Moneim al Huni, seguidos de mais 12 embaixadores nas principais praças europeias, bem como o ministro do Interior e mais 6 generais, 18 brigadeiros e 20 coronéis, anunciaram já o abandono de Kadafhi, juntando-se a revolução popular, contra a manutenção no poder do ditador, no poder à 42 anos, por esta razão reconheceu Huni, que: "o regime fracassou miseravelmente e Kadafhi devia abandonar".
Kadafhi o líder mais cínico
Qualificar Mouamar Kadafhi apenas como ditador excêntrico seria enaltecer a sua personagem. Primeiro, porque não só porque ele cumpre até o último preceito o manual do bom tirano (41 anos no poder, sem nunca ter sido eleito, conversão da Líbia numa coutada familiar, pretensões dinásticas, culto da personalidade, repressão minuciosa dos dissidentes e da oposição), que carrega um toque esquisitamente cínico na sua acção política. Este líder acusa sempre os outros de todos os males que ocorrem na Líbia, pese ser ele o guia da revolução, uma vez ter dito, que em 1977 entregou o poder absoluto através da "Jamahiriya", um sistema político da sua invenção aos órgãos populares. Na tradução por ele mesmo inventada significa "República das Massas"; e quando as coisas não funcionam a culpa, nunca é do líder mas dos órgãos e comités populares". Antes de chegar ao poder, através de um golpe de estado, Kadafhi era um simples capitão de 27 anos de idade.
Kadafhi é um político mais que excêntrico, pois faz coisas como a sua famosa falange de guarda-costas, supostamente virgens e com os seus camelos, ou ainda utilizar vestimentas singularmente exclusivas, mas carecer de limites quando tenta expressar um ponto de vista ou deseja permitir-se a um capricho: foi capaz de interromper uma reunião da Liga Árabe e colocar-se a urinar na sala, ou ainda comparecer num acto oficial maquilhado como uma Barbie com sapatos de tacão.
Falar de um "ditador excêntrico", mesmo que seja em termos relativos, corre-se sempre o risco de se chegar a sua intimidade. Kadafhi é também um dirigente astuto e pragmático, que soube abandonar a tempo o papel de mascote do Ocidente e máximo financiador do terrorismo mundial para converter-se num estadista elogiado em Washington e nas capitais europeias. Um diplomata francês definiu-lhe como "um kamikaze que jamais perde o controlo", enquanto um diplomata americano o considera como "inteligente, ponderado, apesar da sua aparência estúpida".
Diz a história que para se conhecer os homens muitas vezes deve-se rememorar a sua infância e juventude. Muamar Kadafhi nasceu a 7 de junho de 1942 num acampamento beduino próximo do porto de Sirte, numa altura .em que o país se chamava Noráfrica Italiana. A guerra, cujo fim se deu com a queda do império de Mussolini, deixou atrás de si um território desértico arruinado, com uma série de minas e que quase ninguém queria assumir a sua responsabilidade. Foi então que a antiga potência, com base em corredores internos, decidiu entregar o país a um rei, instaurando-se a monarquia de Idris I, homem considerado perfeito aliado das potências vencedoras da guerra. O pequeno Kadafhi, na altura era um beduíno desprezado pelos seus companheiros de classe. Alistado como militar na academia, absorveu os sentimentos que mais unia a sociedade líbia, no seu anticolonialismo furioso, tendo como ídolos Che Guevara e o antigo presidente egípcio Gamal Abdel Nasser.
Assim no dia 01 de Setembro de 1969, liderou um golpe de Estado contra a monarquia, mesmo sendo um oficial intermédio na hierarquia do exército, como simples capitão do Corpo de Sinalização, sem armas a sua disposição; mas como tinha carisma junto de alguns dos seus companheiros, teve o apoio bastante para levar a sua empreitada avante e ser nomeado presidente aos 27 anos de idade.
Coincidência ou não a sua ascensão dá-se numa altura em que o país acabava de descobrir gigantescas reservas de petróleo de excelente qualidade, o qual permitiu a Kadafhi estabelecer um regime baseado em serviços sociais gratuitos (o nível educativo a esperança de vida são hoje os mais altos em África), inseridos no código moral islâmico no nacionalismo panarabista. Imitando Mao Tse Tung da China, outro dos líderes que admirava, publicou entre 1972 e 1975 três tomos do Livro Verde, em que expôs os princípios teóricos da jamahiriya, um sistema legislativo onde as massas se fazem representar, denominado como "democracia perfeita". Tão perfeita, segundo Kadafhi, que o presidente e chefe supremo das Forças Armadas no tem uma patente superior a de coronel, dado que numa sociedade como a Líbia, cujo poder era exercido, na sua concepção, directamente pelo povo, não tem sentido as hierarquias tradicionais.
Impossível detalhar a sua actividade diplomática. Convém recordar que tentou fazer uma união da Líbia com o Egipto, a Siria, a Tunísia e o Sudão. Kadafhi invadiu o Chade e apoiou os três tiranos mais sangrentos no continente africano; Bokassa na República Centro africano, Idi Amin do Uganda e Mobutu no Zaire, para além de ter ainda financiado sem qualquer discriminação ideológicas qualquer grupo guerrilheiro ou terrorista que pedisse dinheiro, apenas com a exigência de se apresentarem como "anticolonialistas" ou "anti-imperialistaa". A sua excentricidade levou-o ainda a participar em actos de terrorismo de Estado no estrangeiro, como a destruição de dois aviões de passageiros da UTA em 1986 e da Pan Am em 1988, para além de uma bomba numa discoteca em Berlim em 1986.
Em 1986 sobreviveu a um bombardeamento ordenado por Ronald Reagan, no qual viria a morrer a sua filha adoptiva Ana, de quatro anos de idade. Anos depois empreendeu, face as sanções a um caminho de reconciliação, pagando indemnizações as vítimas, oferecendo contratos petrolíferos, renunciando continuar a financiar qualquer grupo guerrilheiro e propondo-se combater o "terrorismo radical islâmico". Todas estas acções não chegaram a convencer totalmente o presidente, George W. Bush a recebe-lo, mas enviou a sua secretária de Estado, com quem viria a assinar o plano de compensação aos familiares das vítimas dos aviões abatidos, com o seu apoio, pese o facto de se achar terem sido os serviços secretos da Síria e do Irão, foi Kadafhi a assumir a responsabilidade do desaire. No entanto, em 2008 face a estes seus gestos acabou por ser convidado por Barack Obama a estar presente na Cimeira do G8. No seu sonho de grande líder mundial chegou a sugerir que israelitas e palestinos, fizessem a paz e partilhassem o mesmo país que passaria a chamar-se Isratina. Ao aperceber-se não ter sido levado a sério pelos dois visados, chamou-os "palestinos e israelitas são uns idiotas".
Os angolanos seguramente, conhecem muitos líderes na sua região com o mesmo retrato de Kadafhi.
Quatro décadas de poder absoluto
- 1969. Kadafhi com outros oficiais da esquerda do Exército dá um golpe de estado ao rei Idris I e instaura o Conselho Supremo da Revolução.
- 1973. Declara a Revolução Cultural para criar uma sociedade nova e instalar comités populares nas escolas, hospitais e na Administração.
- 1975. Kadafhi apresenta o Livro Verde, que expõe a sua original concepção de um sistema islâmico politizado, mas sem ser laico nem integrista.
- 1977. Proclama a Yamahiriya (República das massas), que instaura o Congresso Geral d povo e os comités revolucionários.
- 1981. Os Estados Unidos da América derrubam dois aviões líbios no golfo de Sirte, reivindicado por Trípoli.
- 1985. Duplo atentado terrorista nos aeroportos de Roma e Viena. Morrem 19 pessoas. EUA acusa o Governo líbio de estar vinculado com os terroristas.
- 1986. Atentado contra uma discoteca em Berlim frequentada por soldados norte americanos: 3 motos e 300 feridos. Como represália, aviões dos USA bombardeiam Trípoli e Bengazi, matando 44 pessoas, incluindo uma filha de Kadafhi.
- 1988. Atentado contra um avião da Pan Am que estava sobre Lockerbie (Escócia), matando 270 passageiros.
Dois líbios foram acusados pela justiça britânica, mas Kadafhi negou-se a entregá-los.
- 1992. A ONU impõe sanções económicas e diplomáticas a Líbia para que entregue os dois suspeitos do
Atentado de Lockerbie.
- 1999. Entrega os acusados do caso Lockerbie.
A ONU suspende as sanções contra a Líbia, que restabelece as relações diplomáticas com o Reino Unido.
- 2003. O regime líbio assume a sua responsabilidade pelo atentado e aceita indemnizar as vítimas. Kadafhi renuncia ao programa de desenvolvimento de armas de destruição massiva.
- 2006. Restabelece as relações diplomáticas e económicas entre EUA e a Líbia, que Washington tira da sua lista negra.
- 2008. Visita à Trípoli de Condoleezza Rice, a primeira de um secretário de Estado norte americano em 55 anos a Líbia, assinando um acordo para indemnização dos familiares das vítimas dos ataques aos aviões.
- 2009. Reino Unido entrega a Líbia um dos acusados do atentado de Lockerbie por razões de saúde.
- 2010. Acordo entre a União Europeia e a Líbia para controlar a imigração clandestina na Europa.
*Com AG, no Médio Oriente
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