Quem diria que um dia o MPLA iria adoptar a mesma política da PIDE DGS, apelando que se constituíssem grupos de bufos (informadores), nos bairros, para denunciar à polícia a vida dos vizinhos, as suas discussões, as suas leituras, as estações de rádio que escutam e os amigos com quem conversam. E estes "assimilados" do regime, tal como no tempo da outra senhora, podem, também, contar com o contributo e beneplácito da polícia e das forças armadas, que afinal, não são órgãos republicanos, mas ao serviço do partido/Estado, logo defendendo os bajuladores e prendendo mesmo sem culpa formada todos quanto não sejam do vermelho e preto.
Silvio Van-Dúnem
Com esta postura o secretário provincial de Luanda, do MPLA, Bento Bento demonstrou a podridão das políticas do regime, que não vão além da ameaça, prisão, assassinatos e humilhação de todos quantos não aderiram às suas teses. Ao ordenar no dia 01 à vigilância nos bairros contra os que pretendem participar na manifestação anti-governamental convocada para o próximo dia 07, colocou a nu, a fragilidade deste gigante de pés de barro, que não teve nos assassinatos do 27 de Maio de 1977, um dos maiores crimes contra a humanidade, branqueados apenas pelo petróleo (graças a Deus, são crimes que não prescrevem) um mero acidente, mas afinal faz parte de uma cultura dantesca, sempre refinada, pelos seus responsáveis, que mais cedo do que tarde, poderão vir a sentar-se no Tribunal Internacional de Haia.
Mas o anúncio desta elevada decisão, anti-constitucional não poderia ser feita noutra plateia que não a de cerca de 3 mil caciques, cuja missão como membros dos Comités de Acção do MPLA, compete-lhes meter a mão na lama e no sangue dos seus amigos e familiares, apunhalando-os pelas costas, face à promessa de receberem por cada cabeça entregue à polícia, quantia razoável. "Temos que elevar em primeiro lugar a vigilância, denunciar todos quantos estejam nos bairros, nas ruas, quarteirões a planificar esse tipo de ações", disse Bento Bento, informando que a polícia estará às ordens de todos os militantes do MPLA, para prenderem sem provas os denunciados.
Não importa para este dirigente o que diz o art.º 74.º (DIREITO DE ACÇÃO POPULAR) da Constituição da República de Angola, aprovada e feita à medida do próprio MPLA: "QUALQUER CIDADÃO, INDIVIDUALMENTE OU ATRAVÉS DE ASSOCIAÇÕES DE INTERESSES ESPECÍFICOS, TEM DIREITO À ACÇÃO JUDICIAL, NOS CASOS E TERMOS ESTABELECIDOS POR LEI, QUE VISE ANULAR ACTOS LESIVOS À SAÚDE PÚBLICA, AO PATRIMÓNIO PÚBLICO, HISTÓRICO E CULTURAL, AO MEIO AMBIENTE E À QUALIDADE DE VIDA, À DEFESA DO CONSUMIDOR, À LEGALIDADE DOS ACTOS DA ADMINISTRAÇÃO E DEMAIS INTERESSES COLECTIVOS". Ora se por este motivo os cidadãos estiverem reunidos, pura e simplesmente vão parar à cadeia, "QUEIXADOS", pelos BUFOS de Bento Bento, nos bairros, por este dirigente, considerar ser este acto ou uma manifestação pacífica uma "destruição, é de encontrar mais vítimas desse povo que já sofreu tanto, um plano de destruir aquilo que temos estado a construir. Esse plano tem como ponto um, o Presidente (José Eduardo dos Santos)”, assegurou. Mas face a esta orientação, o povo nos bairros já está a redobrar a sua vigilância em relação a determinados dirigentes dos comités de acção do MPLA, evitando-os, por cautela, não vá o diabo tecê-las... "Muitos primos já têm medo de se comunicarem com receio de puderem vir a ser queixados na Polícia, por acto não praticado, até mesmo vizinhos estão a aconselhar as mulheres a evitar contactos, pois no 27 de Maio, muitos bufavam (queixavam) os outros para ficar com as suas mulheres", disse ao F8, Matias André.
E o pior desta violação à lei e a Constituição é o MPLA ter mostrado a todos que ele é o único poder, ao distribuir aos seus BUFOS, um pacote documental com seis páginas, contendo números de telefones da Polícia e do SINFO, para que sejam informados, todos os elementos da oposição ou da sociedade civil, que estiverem a conversar, num número superior a três, porque segundo Bento Bento, o pacote é “um conjunto de estratégias políticas de como deverão agir nos próximos tempos”, que “Angola não é o Egito, a Tunísia ou a Líbia, por isso devemos todos redobrar a nossa vigilância, em defesa do partido e do camarada Presidente José Eduardo dos Santos". Mais uma vez o texto constitucional é mandado às urtigas, vide art.º 64.º (privação da liberdade) "1. A privação da liberdade apenas é permitida nos casos e nas condições determinadas por lei. 2. A polícia ou outra entidade apenas podem deter ou prender nos casos previstos na Constituição e na lei, em flagrante delito ou quando munidas de mandado de autoridade competente".
Pelos vistos no caso vertente dos BUFOS do MPLA para accionarem a Polícia e o SINFO, a autoridade competente é o MPLA e Bento Bento e não os órgãos vocacionados para a aplicação da lei e da ordem. É uma autêntica vergonha ver-se a polícia transformada em meninos de recados, que se não cumprirem "vão apanhar", pois sabem que os chefes batem...
E na criação de bodes expiatórios, o dirigente provincial do partido do regime, tapou a corrupção, a má-gestão, a privatização do Estado, o enriquecimento ilícito dos filhos do presidente do seu partido, da sua família e de alguns elementos da corte bajuladora, para apontar culpados da situação noutras paragens, alegando ter informações dos seus BUFOS de o projecto da manifestação que esteve marcada para o dia 07 de Março, visar "ataques às esquadras da polícia, provocação da polícia para a existência de vítimas, ataques aos comités de acção do MPLA, administrações municipais, responsáveis do MPLA e do Estado, marchas para sítios vitais da administração, nomeadamente ministérios, e Presidência da República", na sua alocução, não conseguiu mostrar uma evidência senão a calúnia e invenção populista. E, não se detendo disse que esta corrente de manifestação levará, igualmente violência, junto das representações diplomáticas de Angola no exterior, nomeadamente em Portugal, Itália, França, Bélgica, Grã-Bretanha e Alemanha, tendo como precaução, o MPLA/Estado solicitado às autoridades desses países o reforço da segurança das embaixadas angolanas.
E no seu populismo e bajulação saloia, Bento Bento, foi quase dizendo: "estes cidadãos são uns ingratos, tão bom é o camarada presidente, que não merece isso, pois se não comem, não têm escola, bons hospitais, casas e emprego a culpa é da crise financeira e do deus deles, que só protege os ricos e bajuladores". Haja ponderação, pois em fases de crise a política não pode ficar nas mãos de pessoas emotivas, bajuladoras e sem tacto, sob pena de incendiarem ainda mais a pradaria, já de si escaldante.
Vamos lá a ser racionais. De facto o MPLA, aquele que apareceu em Luanda em 74/75 não era mais do que uma emanação da ex-União Nacional portuguesa e por isso segui à risca a cartilha da PIDE-DGS, que na versão angolana se chamava DISA. Olhando com distanciamento o comportamento do regime colonial português (só posso falar do período 61-74) e do EME, vejo os mesmos tiques autoritários, a mesma conversa das eleições democráticas, a mesma certeza de quem "governa". Naturalmente que foi seguida a mesma cartilha que se adoptou em praticamente toda a África, copiar o mais negativo do anterior regime e aplicá-lo sob uma nova roupagem. Mas no fundo, no essencial, mantêm-se os mesmos abusos e descriminações. Ah! Há uma diferença, agora há menos brancos e por isso os "artistas" são mais dificilmente "topados" ao longe.
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