quinta-feira, 3 de março de 2011

Angolagate. Pierre Falcone defende Presidente angolano no Tribunal de Recurso de Paris


Os amigos são para as coisas, isso ficou demonstrado na audiência do 21 de Fevereiro, por parte do traficante de armas e empresário francês, ao defender perante os jurados do Tribunal de Paris, o presidente de Angola. Para Pierre Falcone, a sua prisão é uma grande injustiça, porquanto, defende-se, não cometeu nenhum acto ilícito, não passou com as armas por território francês, para além de as ter negociado, com um governo legítimo, o angolano, acossado por uma guerrilha condenada pela comunidade internacional e as Nações Unidas. Bastante emocionado, parece que as suas palavras e justificativas continuam a não demover os juízes franceses, que acreditam na sua ilicitude, quanto a procedimentos nessa relação comercial, bem como na fuga ao fisco, quanto aos verdadeiros milhões envolvidos nas transacções de armamento.

Silvio Van-Dúnem*

O empresário francês Pierre Falcone, um dos principais condenados em primeira instância no processo “Angolagate”, que tentou tudo para escapar a prisão, inclusive, com o apoio do Presidente José Eduardo dos Santos, que em flagrante violação as leis em vigor no país, concedeu-lhe, sem o processo passar por aprovação na Assembleia Nacional e motivos bastantes, nacionalidade angolana e passaporte diplomático. Mais tarde, como caso raro no mundo e digno de entrar no Guiness Book, foi nomeado embaixador de Angola, junto da UNESCO, em Paris, para desta forma gozar de imunidade diplomática e evitar as grades. Igualmente foi concedida a nacionalidade ao traficante russo-isrelita Arcadi Gaidamak, nomeado conselheiro principal na embaixada de Angola em Moscovo. Recorde-se ter sido este diplomático quem preparou a recepção do ex-embaixador Tito em Moscovo, ao ponto de conseguir, que o mesmo, sem mesmo ter sido acreditado, estivesse presente numa cerimónia no Kremlim.

Mas voltando ao julgamento de Falcone no Tribunal de Recurso de Paris, este traficante, não se sabendo se na qualidade de militante do MPLA, de embaixador u de amigo, disse mais: " o Presidente Dos Santos foi sempre a favor de uma solução negociada e de pacificação com a UNITA, mesmo quando as forças governamentais estavam em clara superioridade”, garantiu. É de facto surpreendente a detenção de pormenores tão sensíveis por parte do cabecilha do “Angolagate”.

Falcone cumpre uma pena de prisão pelos crimes de tráfico de armas com vários países africanos, incluindo Angola, e de evasão fiscal e tráfico de influências em França, acusações que ele nega “em bloco” na apreciação do caso em recurso, que decorre desde Janeiro em Paris, afirmando com convicção na audiência de 21 de Fevereiro que “toda a comunidade internacional reconheceu que as violações do cessar-fogo na guerra civil em Angola foram sempre e exclusivamente da UNITA” a partir de 1992. Claramente, esta visão do compatriota da presidência da República de Angola, deve-se ao facto, quiçá da tripla nacionalidade, francesa, brasileira e angolana, pesando mais o facto de ser desde o ano de 2003, o único traficante de armas no mundo, que é representante diplomático de um país junto da UNESCO (Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura), em Paris, no caso Angola. No entanto, face a alegada dimensão dos crimes cometidos, lhe foi retirada a imunidade, por se julgar terem os mesmos sido cometidos com o recurso e utilização do território francês.

A acusação assenta a sua convicção pelo facto de desde 1993, a empresa Brenco, sediada em território francês, logo todos os contactos, directa ou indirectamente, transitavam por aqui, tinha como integrante do grupo a companhia de armamento ZTS-Osos, da ex-Checoslováquia, adquirida precisamente pela empresa francesa, propriedade de Pierre Falcone e Arcadi Gaidamaki, e cujo objecto social era a venda de material, oriundo dos antigos países do Leste europeu, ao Governo de Angola e de outros países africanos em guerra, como a Libéria, Serra Leoa, Sudão, República Democrática do Congo, entre outros.

No entanto uma declaração importante foi revelada pelo também preso, Jean-Charles Marchiani ao afirmar que o traficante judeu russo, "o senhor Gaydamak era um agente do Ministério do Interior francês, nomeadamente da DST", os serviços de informações internos franceses, facto confirmado por Charles Pasqua, com a justificativa de ser um procedimento “normal”, pois a DST “vigiava de perto todas as pessoas com origem no leste europeu, desde o tempo da União Soviética”, acrescentando não ver razões para a sua deplorável situação, que o agasta, por "falta de dignidade de certos titulares políticos da República da França”, denunciou, acrescentando tudo ser do conhecimento das autoridades oficiais, principalmente, no período de coabitação política em França entre 1993 e 1995. Nessa altura, disse Pasqua “havia vários membros do Governo, incluindo o ministro da Defesa e o dos Negócios Estrangeiros, que eram claramente apoiantes de Jonas Savimbi”, tendo até recebido o líder da UNITA em Paris. “Havia, bem entendido, fluxos financeiros entre a UNITA e o RPR”, antigo partido da direita no poder em França.

Recorde-se ainda ter ficado o tribunal a saber, no contraditório terem Falcone e Marchiani viajado juntos a Angola no início de 1995, tendo Marchiani garantido que “estava em missão das Nações Unidas, com instruções do secretário-geral Butros Butros-Ghali” para uma mediação de paz. Mas o que veio a seguir é que deixou uma pulga por detrás da orelha dos jurados, pois alguém que vai pelas Nações Unidas numa missão, é inconcebível que esta organização não providenciasse orçamento, mas foi o que ele disse: "a ONU não tinha orçamento e não pagou um centavo das despesas e do dinheiro que utilizei ou distribuí em Angola, no Congo e no Zaire” a fações da UNITA ou seus equivalentes nos países vizinhos”.

Instado a comentar as declarações, Falcone, não confirmou eventuais contactos de Marchiani com grupos da guerrilha, mas garantiu o facto de ter pago “missões como a de Marchiani em Angola, mas tudo em nome do Presidente angolano, José Eduardo dos Santos e seu governo".

A audiência de recurso de 21 de Fevereiro, que prosseguirá até Marco, foi expressamente dedicada a averiguar e aprofundar às relações entre Pierre Falcone, o seu sócio franco-russo Arcadi Gaydamak, prófugo entre Israel e Moscovo, onde é conselheiro da embaixada de Angola, o ex-ministro do Interior francês Charles Pasqua e um colaborador próximo deste, o ex-prefeito da República Jean-Charles Marchiani. No final, uma fonte disse ao F8, em Paris ter o tribunal ficado com mais dúvidas, quanto a inocência dos implicados, mas que antes de transitar em julgado, "todos em França beneficiam do princípio de presunção de inocência. No entanto o alto envolvimento do Presidente de Angola e do seu governo, tentando influenciar a independência dos tribunais neste país, não ajudou muito o processo e ajudou a formar a ideia de ilicitude, daí terem sido condenados em primeira instância, por não conseguirem provar em contrário a acusação, mas ainda assim, estar a verificar-se estas audiências de recurso. Vamos esperar qual será a decisão final dos jurados, que não são influenciados, nem recebem recados por parte do partido no poder, como acontece em Angola, com os vossos juízes", concluiu.

*Em Paris, com Kuiba Afonso

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