quinta-feira, 12 de agosto de 2010

JORNAL DE ANGOLA, JURA e a insurreição virtual


A vergonha do pensamento ditatorial de um jornal público transformado em partidário

José Ribeiro, director do Jornal de Angola (JA), começou mal o ano e pelos vistos vai acabar pior. Desde as makas do triângulo odioso em que ele se meteu (o contrário do “triângle amoureux” francês), composto por si próprio, o seu sub-director Filomeno Manaças e o irreverente e talentoso Artur Queirós, passando por umas quantas esfregadelas verbais com o amigo Jean-Jacques dos Santos do Chá de Caxinde, o homem teve direito, agora, a uma cereja posta no cimo dum bolo, colocada, antes de o ano acabar, pela equipa de reportagem do JA, que permitiu ao jornal receber um “Leão d’Ouro” pelo seu trabalho feito no decorrer da FILDA. Para os jornalistas o prémio é deles e não do JA, o que é veementemente contestado por José Ribeiro.

Diga-se que a razão, neste caso e no nosso entender, está toda do lado do chefe, pois uma equipa de reportagem só recebe os prémios que são tributados especificamente às equipas de reportagem, o que, portanto, nada têm a ver com um galardão outorgado a um mídia de imprensa, como foi o caso do “Leão” da FILDA, que decidiu premiar o JA.

Esclarecido este ponto, no que nos diz respeito, o que não se compreende é a vertiginosa queda de capacidade de discernimento patenteada pelo director do JA, ao permitir que um “pano sujo do chão” sirva ao mesmo tempo para “passar um brilho” à fachada do “governo” e como prova dum pretenso maquiavelismo da UNITA, precisamente numa altura em que a sua autoridade é contestada pelos editores do jornal que ele dirige.

O artigo em questão, publicado no Jornal de Angola é da exclusiva responsabilidade de José Ribeiro, que, de entrada e em favor da sua publicação, advoga o facto de ser missão do JA denunciar “a criação de factos ou aproveitamento de situações que ocorram no país, tais como eventos políticos, sociais, económicos, culturais, desportivos, académicos e naturais, para desgastar, por todos os meios, a imagem do Presidente da República e transferir o foco de contradições Unita/ MPLA para o Povo/MPLA, alimentando e acirrando contradições sociais e económicas entre MPLA/Governo”. E assegura: “(…) Todas as afirmações são verdadeiras e foram por nós denunciadas” e revelam que “as teses do congresso da JURA defendem a insurreição”. Coisa que, segundo ele, urge revelar ao povo de Angola e ao “governo”.

Começa o artigo a entrar no miolo do assunto e logo Ribeiro mete na boca dum chamado Dinho, militante a UNITA (!?) a denúncia de que ainda não tinha acabado “o tempo da guerra, da subversão, do apelo à desobediência popular e de todas as outras formas de promoção do ódio, do desrespeito às instituições e ao povo ...”, e que essas eram precisamente as propostas da JURA, feitas no decorrer dum “almoço de confraternização organizado pelo maninho Didi Chiwale e (em que) Dirceu Liberty Chaka, que ainda é (era) o Presidente da Jura, fez um discurso inflamado contra tudo e contra todos os que “integram o sistema”. E como prova das suas asserções, eis que o tal de Dinho entrega a Ribeiro “(…)um texto em cuja capa está inscrito: JURA – TESES PARA O II CONGRESSO ORDINÁRIO”, lavrado, portanto. antes de o referido congresso ter sido realizado.

Os atentados à paz gizados pela JURA

Anunciados no discurso proferido por Liberty durante o aludido almoço de confraternização, os assustadores desígnios da JURA, por detrás dos quais, segundo Ribeiro, deve seguramente estar a “mãozinha da própria Direcção do Partido, podem ser reduzidos a um punhado de pontos fulcrais, aos quais juntámos o principal comentário crítico de José Ribeiro, pondo de lado as suas considerações pessoais, algumas delas bonançosas e de “bom pai de família”.

1.- «A JURA/UNITA quer traçar como “desafios político-estratégicos”, dentre outros, “a identificação das oportunidades, ameaças, pontos fortes e fracos” da UNITA e “a definição de planos de acção pró-activos que potenciem oportunidades e forças próprias e maximizem ameaças e fraquezas do adversário (MPLA/Governo)”».

(Comentário de Ribeiro: “A partir daqui comecei a perceber que a JURA para além de estar preocupada com os problemas do Partido, também queria contribuir para “minar” o MPLA e o Executivo”. “(…) Continuei a leitura e juro que levei um susto”).

Por causa do ponto dois.

2. - «A JURA “projecta como oportunidades, a “criação de factos” e/ou “o aproveitamento de situações que ocorram no país” tais como “eventos políticos, sociais, económicos, culturais, desportivos, académicos, religiosos e naturais” (devem querer referir-se a calamidades de qualquer tipo), para “desgastar por todos os meios a imagem do Presidente da República”, “transferir o foco de contradições UNITA/MPLA para o Povo/MPLA, alimentando e acirrando contradições sociais e económicas entre o MPLA/Governo e o povo”, “mediante a propagação” de “denúncias permanentes” do “carácter fraudulento das eleições de 5 e 6 de Setembro de 2008, o golpe jurídico-constitucional de 21 de Janeiro de 2010” e a “ilegitimidade democrática do Presidente da República”, incitando a população a “perder o medo de manifestar-se”».

(Comentário de Ribeiro, “(…) o que a JURA pretende fazer é um apelo irresponsável à desobediência civil. O que a JURA e o Liberty nos propõem é que rejubilemos de alegria perante tudo que de mal possa acontecer ao País e ao nosso Povo. (…) Acusar o Executivo por um mau resultado desportivo, ou porque há seca, e utilizar isso para agitar o Povo para que se manifeste nas ruas contra o Executivo é algo que só pode vir de alguém que ainda não se encontrou com o presente ou então continua imbuído do espírito destruidor que caracterizou a forma de actuar da organização em tempos que não pretendo reviver).

3. – «Liberty, o Chiwale, o Muzemba e outros membros da JURA/UNITA, querem implementar, para lembrar que eles pretendem a “mobilização e enquadramento político de membros e dirigentes de partidos políticos, igrejas e outras associações extintas pelo sistema” e a “cooperação com todas as forças, movimentos sociais e políticos ávidos da alternância do poder».

(Comentário de Ribeiro: “(…) Pensar que participei no processo de libertação e na luta pela democracia e ver o partido UNITA continuar a agir como um “gang de malfeitores” que, á revelia da lei, pretende usurpar o poder, é algo que me constrange e que me preocupa sobremaneira”).

4. - «A JURA/UNITA pretende “deslocar o combate das instituições públicas para as ruas, praças, bairros, escolas, hospitais, etc.”, sustentando que o “regime deve ser levado a combater no terreno escolhido pela oposição e que lhe seja desfavorável” para que “a população se torne mais auto-confiante no desafio ao poder”».

(Comentário de Ribeiro: “Fiquei incrédulo: será que a UNITA assume, como nossa (sua), a estratégia de criar o caos social e, por essa via ascender ao poder? Invadiu-me o espírito a convicção de que esta estratégia não pode estar a ser gizada pela nossa (sua) organização juvenil e que por detrás disto tem que estar a própria Direcção do Partido, sendo que aquela apenas está a servir de instrumento)”.

5. - De acordo com a proposta de teses para o II Congresso, a JURA/UNITA pretende “enfraquecer economicamente o regime e provocar a falta de recursos financeiros e materiais”, motivando a retracção do investimento estrangeiro e consequentemente “reduzir as fontes de financiamento do poder (entenda-se Executivo), causando atrasos no pagamento de salários, inclusive das Forças de Defesa e Segurança do Estado”, com o objectivo de criar um clima de “insatisfação geral”, visando o “princípio do fim” do regime.

(Comentário de Ribeiro: os mentores da estratégia apelam à observância do sigilo por acreditarem que quanto maior for a capacidade de guardar segredo dos planos e intenções, maior será a força da organização em surpreender o adversário e resultará em mais confiança na juventude. Tendo tomado conhecimento disto, jamais me calaria. Desde logo porque o único adversário que vislumbro na pseudo-estratégia é o Povo Angolano. Assim sendo, também me sinto na pele de adversário, porque, com orgulho e honra jurei servir a Pátria e, por isso mesmo, não defendo interesses mesquinhos e, muito menos, acobertarei criminosos).

Apocaplypse Now

A mensagem veiculada por José Ribeiro tem uma preciosa qualidade, digna de grande realce no nosso país, a de ser clara e simples: a UNITA aposta no caos social num momento de lucidez.

“(…) a UNITA assume, como nossa (sua), a estratégia de criar o caos social e, por essa via ascender ao poder. (…) O único mérito que se pode colher da constatação que a JURA/UNITA faz”, diz ele a certa altura, “é que em todo o tempo que perderam a definir os termos da conspiração contra o Estado e o nosso Povo, houve um momento de lucidez em que se assumiu que o mais importante é destruir”.

Verifiquemos a justeza deste raciocínio ponto por ponto. Simples também. Podemos fazer uma análise global aos pontos, um, dois, três e quatro, todos eles conformes a práticas usuais em democracia, tal como a conhecemos nos dias de hoje, usada, é verdade, deturpada, por vezes violada por sistemas modernos de controlo e instrumentos vários de cooptação e marginalização. E, verdade se diga, nessa área o “governo” de Angola é mestre.

Nos países com tradições democráticas de centenas de anos, esses instrumentos de dominação são vigorosamente combatidos pelas forças da oposição política ao regime instalado, e a verdade é que conseguem por vezes bons resultados, dos quais resulta sempre uma mudança de partido a gerir o país, finalidade primordial da democracia.

Em Angola, correntes de opinião, por assim dizer, não há – veja-se o que está a acontecer à UT-MPLA, no seio do próprio partido dominante. Contestação também, não há!... Tirando esta vigorosa reacção da JURA, a oposição, depois de ter sido completamente dizimada por via de recursos a métodos inconfessáveis, parece que se calou de vez.

Assim, seguindo o pensamento de José Ribeiro, a JURA/UNITA, à parte querer “desgastar, por todos os meios, a imagem do presidente Eduardo dos Santos”, o que vai de si em qualquer democracia, propõe, no ponto um, “minar o MPLA e o executivo”, o que também é um objectivo primordial de todos os partidos de oposição do mundo. Todos, sem excepção! O poder desgasta-se com o tempo e a função da oposição é de contribuir para esse desgaste, não para ajudar o poder a ficar no poder!

No ponto dois, o JA pretende que a UNITA faz um apelo irresponsável à desobediência civil, na medida em que incita à propagação” de “denúncias permanentes” do “carácter fraudulento das eleições de 5 e 6 de Setembro de 2008, do golpe jurídico-constitucional de 21 de Janeiro de 2010” e da “ilegitimidade democrática do Presidente da República”, incitando a população a “perder o medo de manifestar-se”.

Balelas! Tudo isso faz parte do jogo político em democracia, tanto mais que toda a gente sabe que os 82% de votos não vieram só dos votos das urnas, que os 30 anos de Eduardo dos Santos na presidência são uma negação da democracia e que as manifestações de rua constituem um direito constitucional.

No ponto três, Ribeiro diz que a UNITA continua a agir como um “gang de malfeitores” que, à revelia da lei, pretende usurpar o poder, e isso porque pretende recuperar para o seu lado os descontentes e fazer todos os esforços para obter uma “cooperação com todas as forças, movimentos sociais e políticos ávidos da alternância do poder”.

Chefe Ribeiro, isso, é um dos fundamentos da democracia! O senhor está indignado, porquê!?...

Enfim, no ponto quatro, a UNITA recusa continuar o combate político no seio dos bastidores do Estado, por saber que eles estão muito mais minados do que o Moxico e o Kuando Kubango. Deseja, sim, um confronto aberto junto das massas populares, de modo a que o regime seja levado “a combater no terreno escolhido pela oposição e que lhe seja desfavorável” para que “a população se torne mais auto-confiante no desafio ao poder”.

E não, francamente, já não vale a pena fazer mais comentários, porque estamos realmente convencidos de que a sua necessidade de salvar o posto que ocupa no JA se sobrepõe a toda e qualquer forma de raciocínio. O seu artigo é um mero artefacto, destinado a dar lustre ao executivo angolano, mais que farto das suas “gafes”. E mais nada.

Mas falta ver o ponto cinco, e aí é que a porca torce o rabo, pois a denúncia é feia. Mas somente porque se está a ver de um lado, sem ver o outro. Ora, para além do facto de estes planos terem sido revelados num discurso de Dirceu Liberty Chaka durante um almoço de confraternização, certamente com dezenas, talvez centenas de “maninhos”, vê-se mal como ele poderia exigir o sigilo destes planeamentos secretos (“(…) os mentores da estratégia apelam à observância do sigilo”…).

O que nos parece lógico é que, mesmo que sejam esses os termos exactos em que a JURA manifestou o seu plano de acção, mais não fez que responder taco-a-taco à permanente, exclusiva, e fecundíssima espoliação de todos, dizemos bem, todos os meios, riquezas e fundos do Estado, em benefício de uma meia dúzia de famílias, todas elas “patriotíssimas” e detentoras de cerca de 95%, ou mais, de todos os bens materiais de Angola. Uma roubalheira sem nome.

O apelo da JURA, mesmo com os seus exageros… de acordo, tem-nos e a juventude é isso mesmo, é uma lufada de ar fresco, sadia, no pântano nauseabundo da politiqueirice angolana vigente!

Um comentário:

  1. Mpla perdeu o controle de si mesmo e por isso , utilizam agora todo tipo de argumentos até dos mais sujos para se defenderem

    ResponderExcluir