No seu último relatório “Presidência da República: O Epicentro da Corrupção em Angola”, o jornalista angolano e activista dos direitos humanos, Rafael Marques de Morais, expõe as ligações de um triumvirato de altas figuras, do círculo restrito do Presidente José Eduardo dos Santos, a negócios ilícitos.
Compõem o trio o ministro de Estado e chefe da Casa Militar da Presidência da República, o chefe de Comunicações da Presidência da República e o presidente do Conselho da Administração e director-geral da Sonangol, respectivamente o general Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”, o general Leopoldino Fragoso do Nascimento “Dino” e Manuel Vicente.
“As suas negociatas não distinguem entre o património público e o interesse privado. Essa promiscuidade tem garantido a transferência de milhões de dólares, em termos de bens públicos, para as suas iniciativas privadas”, diz Marques de Morais.
Um dos mecanismos usados pelos referidos dirigentes, ao serviço dos seus interesses particulares, é o poder e a reputação internacional da Sonangol, bem como a capacidade de influência que estes exercem nas decisões do presidente, como o chefe do executivo que aprova todos os investimentos superiores a cinco milhões de dólares. Através da sua empresa Nazaki, o trio estabeleceu uma parceria com a Sonangol e a Cobalt, um empresa petrolífera americana listada na bolsa de valores de Nova Iorque.
O executivo, sem concurso público, concedeu a este consórcio licenças para a exploração de dois blocos de petróleo em águas profundas (9 e 21).
Com a Sonangol e a multinacional Brazileira Odebrecht, o grupo também formou um consórcio, através da Damer, para um projecto de 272.3 milhões de dólares destinado à produção de açúcar, álcool e biocombustíveis. O projecto foi aprovado pelo Conselho de Ministros, sob orientação presidencial.
Os mesmos indivíduos, de acordo com o relatório, usaram altas patentes, afectas à Presidência da República, como testas-de-ferro da empresa Portmill. Esta, por sua vez, pagou 375 milhões de dólares ao Banco Espírito Santo, de Portugal, para a compra de 24% das acções da sucursal deste banco em Angola. A mesma empresa, Portmill, recebeu 40% das acções da empresa de telefonia móvel, Movicel, recentemente privatizada pelo Estado. O relatório questiona a origem da incrível soma monetária paga pelos oficiais da guarda presidencial ao banco português. Também questiona o envolvimento do Banco Espírito Santo na lavagem de dinheiro eventualmente saqueado dos cofres do Estado angolano ou de origem obscura.
O autor detalha como os generais Kopelipa e Dino, em sociedade com Manuel Vicente, também criaram um conglomerado de órgãos de imprensa para, de modo estratégico, controlarem o sector privado, entre outros interesses particulares.
“Esses dirigentes atropelam as leis com flagrante impunidade”, diz Marques de Morais. Segundo explicações suas, “a Lei dos Crimes Cometidos por Titulares de Cargos Públicos, em vigor desde 1990, proíbe os dirigentes de realizarem negócios com o Estado ou mesmo privados, para os quais tenham poder de decisão ou influência, para benefícios pessoais”.
O autor argumenta que enquanto há uma crescente pressão sobre os governos e companhias para uma gestão mais transparente, com campanhas internacionais como a Iniciativa de Transparência nas Indústrias Extractivas e Publique o que Paga, “em Angola, a salvaguarda dos princípios de transparência apenas existe em papel e os mesmos nomes de governantes e generais proeminentes ressurgem no quotidiano com vidas duplas, como altos funcionários públicos e empresários privados”. Ademais, de acordo com Marques de Morais, “a complexa teia de poder político-militar e económico é lubrificada com fundos pilhados ao Estado ou adquiridos de forma obscura, e frequentemente em parceria com empresas estrangeiros e governos”. Marques de Morais, que se tem dedicado a investigar a corrupção em Angola, há anos, não acredita nas intervenções públicas do presidente contra a corrupção. “Na realidade, a política de tolerância zero contra a corrupção, anunciada pelo Presidente José Eduardo dos Santos, é uma mera máscara para encobrir a pilhagem do país pelo seu círculo restrito de colaboradores”, diz.
Alguns governos ocidentais, liderados pelos Estados Unidos da América, têm disputado a sua influência política em Angola, no acesso ao petróleo e outros recursos do país e, para o efeito, têm apelado apenas por hipocrisia, à necessidade de boa governação no país. A 8 de Julho de 2010, os Estados Unidos e Angola assinaram o acordo de Parceria Estratégica para o Diálogo com vista a incrementar as relações bilaterais sobre a “energia, segurança, e promoção à democria”, segundo nota do Departamento de Estado. No entanto, outros parceiros económicos importantes de Angola, como a China, Brasil e Portugal têm alimentado, de forma directa, a corrupção, através de concessão de linhas de crédito por petróleo e acordos económicos bilaterais opacos. Tais comportamentos asseguram que pouco ou nada se altere em Angola, excepto o dinheiro envolvido que se torna cada vez mais apetecível.
“Os dividendos do poder, em Angola, são partilhadas por uns quantos, enquanto a maioria absoluta permanence pobre”, conclui Marques de Morais.
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