terça-feira, 24 de julho de 2012

Os do MPLA engoliram sapos


Além da “recomendação” do seu conselho familiar no sentido de declinar, na próxima legislatura, qualquer oferta ou proposta para ocupação de cargos públicos, é de todo improvável que Fernando da Piedade Dias dos Santos “Nandó” pondere outras formas de manifestar a José Eduardo dos Santos (JES) o seu desagrado pelo modo pouco católico como soube que não seria reconduzido ao posto de vice-presidente da República.


Apesar da sua condição de coadjutor do Presidente da República, Nandó não teve informação privilegiada. Ele soube que não seria reconduzido e, portanto, estava fora da corrida para a sucessão presidencial no mesmo momento em que José Eduardo dos Santos comunicou a sua decisão a todos os membros do Bureau Político do MPLA. Em paragens onde se cultiva o respeito ao próximo, sobretudo quando esse próximo é, pelo menos formalmente, o braço direito, JES teria chamado Nandó para, em privado e em primeira mão, lhe comunicar as suas novas opções.

Além de, sem qualquer aviso prévio, se ver empurrado para fora da cadeira de vice-presidente da República, Nandó viu também o seu nome colocado no 14° lugar da lista de deputados, muito distante da nova coqueluche de José Eduardo dos Santos, e também de outros militantes que não têm – nem de perto, nem de longe – a sua expressão no MPLA. Tal é, por exemplo, o caso de Gustavo Conceição, muito provavelmente compensado por haver conseguido, em pouco tempo, o que vários países africanos procuraram, porfiadamente, anos a fio: tirar de Angola o título de campeão africano de basquetebol masculino com o que, outro feito dele, tornou problemática a participação da nossa equipa nos Jogos Olímpicos de Londres.

Mas apesar do tratamento pouco consentâneo que José Eduardo dos Santos lhe dispensou, o vice-presidente da República engoliu estoicamente o sapo e não fará nenhum gesto, de que o “Chefe” se possa aperceber, que denuncie algum desconforto estomacal.

Outros pesos pesados do partido (e nisso José Eduardo dos Santos deve ser “felicitado” por haver distribuído o mal por várias capelas) também engoliram sapos muito bem nutridos. Tais são os casos de Roberto de Almeida (que deve o 3° lugar na lista não porque o “Chefe” o considere merecedor de tal mas devido aos fretes que faz), João Lourenço, um antigo secretário-geral do MPLA, que apesar de ser vice-presidente da Assembleia Nacional pelo segundo mandato consecutivo, se viu, agora, suplantado por Joana Lina, sua inferior hierárquica. Mas não é apenas o 16° lugar que incomoda João Lourenço . O que pode criar algum frisson “lá em casa” é o facto de José Eduardo dos Santos ter colocado Ana Dias Lourenço, mulher de João Lourenço, em 8° lugar, exactos 8 furos acima do marido. Considerando que a ordem de precedência da lista não é alfabética, então tem-se que na avaliação política de José Eduardo dos Santos (e vá-se lá saber porquê) Ana Dias Lourenço, actual ministra do Planeamento, conta mais do que o marido.

Resignado com o tamanho do sapo que lhe coube está, igualmente, o actual presidente da Assembleia Nacional, Paulo Kassoma. A posição em que foi colocado na lista dos candidatos do MPLA quase sugere que faltou muito pouco para ser empurrado para o banco dos suplentes. O 41° lugar é demasiado desonroso para quem está no exercício do cargo. Sobretudo quando todos os seus lugares-tenentes (primeiro e segundo vice-presidentes e secretária da mesa) estão colocados em posições bem acima da sua.

Nandó, Roberto de Almeida, João Lourenço, Paulo Kassoma, Dino Matross e outros (bem comportados) não engoliram apenas um sapo: foram dois! O primeiro, já vimos, é a ordem de precedência na lista de deputados.

O segundo, bem maior e que por isso mesmo continua atravessado na goela de muitos deles, é a forma como José Eduardo dos Santos impôs a todos o nome da Manuel Vicente para a vice-presidência da República.

Ao Maka Angola chegaram informações segundo as quais a contestação ao nome de Manuel Vicente atravessa quase todo o Bureau Político do MPLA. Até mesmo conhecidos incondicionais de José Eduardo dos Santos, como Bornito Sousa, Dino Matross ou Gonçalves Muandumba ( este homem ficará irremediavelmente “paraplégico” no dia em que Sua Excelência partir, seja por vontade própria, seja empurrado pela vontade popular) andarão descontentes com a forma como o chefe de todos eles conduziu o dossier Manuel Vicente. Mas, tarimbados no ofício de tudo engolir, todos eles se resignam a mais um capricho de José Eduardo dos Santos. Afinal, a subserviência e a resignação estão no “DNA” dos camaradas…

Por isso mesmo serão descabidas informações que circulam em Luanda segundo as quais, nos últimos dias, alguns membros do Bureau Político do MPLA estariam a fazer romaria a uma famosa quinta que um deles possui no Kikuxi com o propósito de “reflectirem” sobre os últimos acontecimentos.

Nas actuais circunstâncias é muito improvável que membros do Bureau Político ousassem oferecer o rosto a uma contestação contra quem lhes serve os miseráveis pratos de lentilhas com que se contentam. Nem mesmo em sonho ousam fazê-lo.

José Eduardo dos Santos conhece todos e cada um dos cordeiros do seu rebanho. E sabe-os incapazes de sentimentos tão elementares como a indignação ou a revolta. Como se diria em linguagem popular, estão todos dominados. Em 1998 afastou da direcção do MPLA dois antigos secretários-gerais (Marcolino Moco e Lopo do Nascimento) sem que o céu desabasse. Em 2003 fez o mesmo a João Loureço, outro antigo secretário-geral, e ninguém lhe pediu contas. Antes, em 2000, mandou para casa o venerado e temido Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas Angolanas (FAA), general João de Matos, sem que a estrutura castrense tivesse abanado minimamente. E para mostrar que tinha a situação sob absoluto controlo, JES partiu tranquilamente para uma visita oficial aos Estados Unidos.

Agora repetiu o esquema. Depois de haver, mais uma vez, vergado tudo e todos aos seus caprichos (e na passada criou o maior pandemónio de que há memória na comunicação social pública, deixando a titular da pasta, Carolina Cerqueira, em estado de humilhação), JES foi sossegadamente gozar férias ao Reino de Espanha, plenamente certo do domínio total da situação.

Neste momento de desconfortos estomacais, com a devida vénia, o Maka Angola “dedica” a Nandó, Roberto de Almeida, Paulo Kassoma, João Lourenço, enfim, aos milhares de militantes do MPLA obrigados a empurrar goela abaixo tudo o que José Eduardo dos Santos lhes serve nos pratos, um poema do seu correligionário, o deputado do MPLA, escritor e jornalista João Melo:

«O Cão»

“Cão pontapeado pelo dono
lambe-lhe as botas
Homem servil
é cão supracitado”.

*Makangola

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